CANSAÇO, UM SINAL DE ALERTA


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12.04.2017, 11:38

QUANDO O ESFORÇO NÃO É MAIS SUPORTÁVEL

Para Philippe Zawieja, psico-sociólogo e coordenador do recém lançado Dictionnaire sur la fatigue (Dicionário sobre a fadiga), o discurso a respeito do fenômeno do burn-out se aproxima daquele que se fazia sobre a neurastenia no século 19.



Entrevista por: Pascale Senk – Le Figaro Santé

Le Figaro Santé – Por que reunir 90 autores e publicar um dicionário sobre a fadiga?
Philippe Zawieja – Depois de pesquisar durante muitos anos sobre a saúde psicológica no trabalho e notadamente sobre o fenômeno que os americanos chamam de burn-out (um misto de grande fadiga com estresse), me pareceu que o discurso que estamos fazendo sobre as causas e as modalidades do fenômeno se aproxima em numerosos pontos daquilo que dizíamos no século 19 a respeito da neurastenia. Comecei a me perguntar se cada época n  ao teria a sua “fadiga fetiche”, e sua maneira particular de se ocupar dela. A partir desta hipótese, me pareceu que a literatura, a espiritualidade, a psicologia e também a antropologia tinham muito a dizer sobre essa experiência íntima e quotidiana até agora quase unicamente abordada pela medicina. O dicionário é o fruto dessa abordagem pluridisciplinar.
Você estabelece uma clara distinção entre a “fadiga” e a “sensação de fadiga. Por que?
Para a medicina, a fadiga é tanto um fenômeno normal que surge depois de um esforço preciso, ou um sintoma ligado por vínculos lógicos a uma doença, ou seja, uma queixa que é necessário explorar. O conhecimento a respeito dessa queixa não é nunca, portanto, definitivo ou assegurado. É a sensação de fadiga aquela que coloca interrogativos , e ela é com frequência o fruto de conflitos intrapsíquicos, o resultado de uma luta interna que deixa o sujeito prostrado sem que ele tenha uma consciência funcional disso.
Vivemos numa sociedade que nos exorta muito a controlar nossas emoções, de fazer com que elas sejam confinadas no interior de padrões bem definidos. É isso que acontece nos casos de burn-out?
Sim. Tudo parte de uma estratégia para superar o estresse crônico. As causas estressantes em questão podem estar ligadas à carga de trabalho ou a um ambiente relacional deletério, e diante do estresse que esses fatores engendram, as vias de resolução acionadas pelo sujeito afetado são inoperantes. Ele tem a sensação de que os esforços que faz para sair do atoleiro não servem para nada, são inúteis. Até mesmo o repouso não funciona mais.
Você, por sinal, já escreveu mito a respeito da fadiga emocional.
Sim. Penso que vivemos em uma sociedade que nos solicita insistentemente para que controlemos nossas emoções, para que as confinemos dentro daqueles padrões bem definidos. Ela nos instiga a que aprendamos a gerir as boas emoções, da melhor forma possível e em todas as situações. Mas isso muitas vezes é praticamente impossível. Pense nos profissionais que trabalham em contato com o público. Os que militam nos balcões ou nas recepções e que são instados a ser sempre sorridentes e amáveis com os clientes, ao mesmo tempo em que são obrigados a correr com rapidez de uma escritório a outro, de uma seção da loja para outra, ao mesmo tempo em que os clientes podem ser agressivos e mal-educados. Nesses casos fatalmente uma dissonância entre a emoção sentida e a fisionomia manifestada, o que dá origem a um conflito interior.
Então, que significa a fadiga?
Ela serve para dizer que um esforço não é mais suportável. Que a pessoa faz apelo à solidariedade do outro porque ela está em sofrimento. Durante muito tempo fadiga e preguiça estiveram associadas, mas hoje essa fadiga passou a ser considerada anormal, produzindo “vítimas”. Às vezes, também, ela pode ser instrumento de manipulação: eu manifesto minha fadiga para que uma outra pessoa venha fazer meu trabalho.
Hoje, o mercado de trabalho é tão “viscoso” que nós tivemos de aprender a nos encrustar em nossos empregos, o que leva diretamente ao tédio e a outros fatores que provocam o burn-out. Como foi que chegamos a esse ponto?
O problema maior da nossa sociedade, é a relação com o trabalho. Vivemos uma importante crise dos modos de regulação das insatisfações profissionais. Há quarenta anos, mais ou menos, se eu me sentisse mal no desempenho das minhas funções, poderia solicitar um aumento do salário para me sentir mais motivado, ou poderia pedir uma promoção, uma mudança de função, etc. Poderia inclusive pedir demissão e encontrar rapidamente um novo emprego, porque a situação economia o permitiria. Hoje, o mercado de trabalho é tão “viscoso” que nós tivemos de aprender, como você mesma disse, a nos encrustar em nossos empregos, o que realmente leva ao tédio e aos outros burn-outs...
Isso também leva a uma crise existencial?
Sim. O discurso da performance que contaminou todas as esferas da nossa vida nos incita a nos voltarmos para ideais essencialmente societários: ser ou pai ou mãe exemplares, um trabalhador sem defeitos, um amante infatigável... Todas essas quimeras que perseguimos inutilmente acabam nos levando à exaustão.

(*) Philippe Zawieja é pesquisador associado da École des mines e da Universidade de Sheerbroke. Elecoordenou a edição do Dicionário da Fadiga (Éditions Droz).


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