Ele era um verdadeiro mar salgado situado no coração da Ásia Central. Seu quase total desaparecimento nas últimas décadas é um dos maiores desastres ecológicos da história
16 DE AGOSTO DE 2012 ÀS 15:33
Fotos: Divulgação
O que são essas centenas de navios enferrujados, atirados sobre as areias do deserto? São os restos de um dos maiores desastres ambientais já produzidos pela mão do homem. Até pouco mais de vinte anos, todos eles navegavam sobre as águas do quarto maior lago do planeta em superfície. Ele se estendia sobre essa área hoje ressequida. Era o lago Aral, verdadeiro mar salgado de origem oceânica situado na fronteira entre o Uzbequistão e o Cazaquistão.
Da década de 1970 até hoje, sua superfície foi reduzida em 75%, e dos 68 mil quilômetros quadrados da área original sobram apenas cerca de 10%. Os restantes 90% são só areia, entremeada aqui e ali de alguns tufos vegetais de espécies que conseguem vencer a altíssima salinidade do solo. Toda a água que outrora existiu, simplesmente desapareceu.
Como isso aconteceu? Nos tempos da Guerra Fria, entre as décadas de 1950 e 1960, para incrementar a produção de algodão numa região árida como o Uzbequistão, o regime soviético pôs em prática um projeto de desvio através de canais artificiais das águas de dois rios – o Amu Darya e o Syr Darya - que, desde tempos imemoriais, alimentavam o mar de Aral. A água desviada foi utilizada para irrigar os campos das recentes culturas agrícolas estabelecidas nas áreas próximas.
Sem os rios que o alimentavam, o Aral rapidamente secou, deixando em seu lugar um deserto de areia salgada e tóxica sobre a qual sobrevivem apenas os esqueletos em decomposição das naves que, no passado, singravam suas águas. Para criar as plantações de algodão, com efeito, enormes quantidades de herbicidas altamente tóxicos foram utilizadas, poluindo irremediavelmente toda a área circundante. A tal ponto que, ainda hoje, a poeira poluidora é levada pelo vento das frequentes tempestades de areia até os picos das montanhas do Himalaia, cordilheira não muito distante dali.
Antes dessa hecatombe ecológica, os rios que alimentavam o mar de Aral mantinham a baixa concentração salina e mineral da água, permitindo a existência de um rico ecossistema aquático que garantia o sustento de mais de 60 mil pescadores.
Hoje, em muitos pontos, o litoral recuou mais de 100 quilômetros. Esse outrora vasto mar interior está agora dividido em três porções menores, todas elas em avançado processo de desertificação.
A outrora próspera indústria pesqueira foi praticamente extinguida, provocando desemprego e dificuldades econômicas. A região também foi fortemente poluída, acarretando graves problemas de saúde pública. O recuo do mar também já teria provocado uma acentuada mudança climática na região, com verões cada vez mais quentes e secos, e invernos mais frios e longos.
O Mar de Aral, em fotos por satélite, sucessivamente nos anos 1989, 2003 e 2009. A redução de suas águas é simplesmente dramática
Nos últimos anos, o Cazaquistão encetou esforços contínuos para salvar do total desaparecimento pelo menos a pequena porção restante do norte do Mar de Aral. Como parte desse esforço, o projeto de uma barragem foi concluída em 2005 e, graças a ela, em 2008 o nível de água nessa área já havia subido doze metros a partir de seu nível mais baixo, ocorrido em 2003. A salinidade caiu , e os peixes ali agora são encontrados em número suficiente para viabilizar pelo menos a pesca esportiva. No entanto, as perspectivas para o mar remanescente, ao sul permanecem sombrias.
Vídeo
Aral, o mar perdido
De: Isabel Coixet, jornalista espanhola especializada em documentários
http://www.brasil247.com/pt/247/revista_oasis/74858/Aral---O-mar-perdido.htm