João Calvino 3

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A saída atribulada de Genebra[editar | editar código-fonte]

A 16 de janeiro de 1537, as autoridades da cidade de Genebra aprovaram o documento escrito pelo líder protestante Farell, que se destinava a servir de confissão de fé e orientação para todos os habitantes de Genebra. Calvino fez também algumas sugestões, parte das quais foram rejeitadas. Cerca de vinte artigos dispõem, entre outras coisas, que os idólatras, querulantes, assassinos, ladrões, bêbados (entre outros) sejam futuramente excomungados. As lojas deviam fechar ao domingos, assim que soassem os sinos da igreja.
Estas disposições, apesar de aceites pelas autoridades criaram atritos com Farell e Calvino. O estigma da excomunhão é extremamente discriminador e destruidor de relações sociais no século XVI.
Em março, os líderes anabaptistas de origem holandesa Hermann de Gerbihan e Benoît d'Anglen são expulsos de Genebra, juntamente com os seus seguidores.
Em abril de 1537, por sugestão de Calvino, foi constituído um "syndic" (síndico) que teve por objectivo ir de casa em casa e inquirir sobre a confissão dos moradores. A acção foi contestada. Alguns moradores recusaram-se a pronunciar-se sobre a sua fé.
Em junho de 1537, as autoridades de Genebra decidiram que o domingo seria o único dia feriado. Futuramente nenhum outro feriado seria considerado.
O dia 30 de outubro foi definido como o prazo para todos os moradores de Genebra se pronunciarem quanto à sua religião. Aqueles que não reconhecem os decretos de Farell são obrigados a deixar a cidade em 12 de novembro.
Após esta data, a situação complicou-se para Farell e Calvino. Particularmente provocante foi o facto de um estrangeiro (francês), como Calvino, decidir sobre a excomunhão e expulsão de habitantes naturais de Genebra. As autoridades, perante estes protestos, passam a ser mais críticas para com os líderes protestantes.
A 3 de fevereiro de 1538 foram eleitos para as autoridades da cidade de Genebra quatro pessoas que eram inimigos de Calvino e dos protestantes. Em março, estas novas autoridades proibiram Calvino e Farell de se pronunciarem sobre assuntos não religiosos.
Calvino e Farell negaram-se a celebrar a comunhão de acordo com a tradição de Berna. Foram proibidos de celebrar os serviços religiosos. No entanto, no domingo seguinte, 21 de abril de 1538, Farell e Calvino celebraram o culto de Ceia como habitualmente, Farell na Igreja de Saint-Gervais e Calvino na de Saint-Pierre. As autoridades deram-lhes três dias para saírem da cidade.

Estrasburgo[editar | editar código-fonte]

Em 1538, Farell irá refugiar-se em Neuchâtel. Calvino dirige-se a Estrasburgo, após ter inicialmente pretendido ir para Basileia. Estrasburgo era na altura parte da zona de língua alemã, mas a proximidade da fronteira com a França significava que ali se tinha desenvolvido uma comunidade de exilados franceses. Tal como em Genebra Farell reconhecera o potencial de Calvino, em Estrasburgo Martin Bucer foi o protector de Calvino. Durante três anos, Calvino dirigiu em Estrasburgo uma igreja de protestantes franceses, a convite de Bucer.
Segundo o biógrafo Courvoisier, Estrasburgo foi a cidade onde Calvino tornou-se verdadeiramente Calvino. O seu sistema de pensamento foi lá consubstanciado em algo de mais marcadamente original. A sua obra Institutio lá foi re-editada (1539). Era então três vezes maior do que a primeira edição.
Em outubro de 1539, Pierre Caroli chegou a Estrasburgo, onde permaneceu pouco tempo. Caroli e Calvino, inimigos desde há anos, tiveram uma disputa. Caroli estava então algures entre o catolicismo e o protestantismo. Ele acusou Calvino de o ter confundido na sua fé. Calvino sofreu uma crise nervosa.
Neste outono de 1539, Calvino escreveu também um comentário à carta de Paulo aos Romanos. Este tema é particularmente querido do protestantismo, porque ali se encontra a justificação através da fé como a base de sustentação do movimento protestante, pois somente a fé salva e justifica. A igreja é por este prisma mais uma comunidade de crentes do que um enquadramento jurídico. Os sacramentos só recebem o seu sentido através da fé. Sem fé não têm qualquer efeito. Já Lutero tinha destacado a carta de Paulo aos romanos como o cerne do Novo Testamento e o mais alto do evangelho.

Matrimônio[editar | editar código-fonte]

Em Estrasburgo, Calvino casou-se em agosto de 1540 com a viúva Idelette de Bure, que tinha sido previamente adepta do anabaptismo. Traz duas crianças do seu prévio casamento. Calvino tem 31 anos de idade. A cerimónia do casamento foi dirigida porGuillaume Farel.
Em 1541 a peste negra (ou peste bubónica) recrudesceu em Estrasburgo. Idelette e as duas crianças procuram abrigo em casa de um irmão dela, nas redondezas.

Regresso a Genebra[editar | editar código-fonte]

Após a expulsão de Calvino, Genebra tinha adoptado os ritos de Berna. O natal, ascensão de Cristo e outras festividades cristãs voltaram a ser praticadas. Mas os católicos e os anabaptistas continuavam a ser perseguidos e "convidados" a deixar a cidade. A 18 de março de 1539 o jogo tinha sido proibido em Genebra. Pedintes e vagabundos eram expulsos da cidade. A ausência de Calvino não tinha significado qualquer laxismo na moral estrita imposta na cidade.
As relações de Genebra com Berna permanecem tensas. Entretanto, os líderes que se opunham a Calvino (os chamados "artichoques") começaram a perder influência. Foram acusados de simpatia por Berna. Jean Philip (João Filipe), um de seus líderes, foi torturado e decapitado em 1540. Os oponentes, favoráveis a Calvino, chamados de "guillermins" ganham o poder.
Calvino foi convidado em outubro de 1540 a regressar a Genebra, para reaver o seu posto na igreja, tal como o tivera antes da expulsão. A 13 de setembro de 1541, Calvino chegou pela segunda vez a Genebra, mas, desta vez definitivamente. Começou, então, a organizar e estruturar, de acordo com as linhas bíblicas, os ministérios e a acção dos professores e diáconos.

Zelo religioso radical[editar | editar código-fonte]

São ainda de 1541 as propostas de Calvino, no sentido da reorganização da igreja. As "Ordonnances de 1541" dispuseram a formação de quatro corpos:
  • Pasteurs (pastores, que pregam)
  • Docteurs (ensinam)
  • Anciens (os mais velhos, que chamam à ordem aqueles que prevaricam)
  • Diacres (diáconos, que ocupam-se dos pobres e doentes) - mendigar é estritamente proibido
Foi decidida também a criação de um consistório - composto de elementos da igreja e de laicos - que se reúne regularmente para julgar os comportamentos individuais, como um tribunal, "de acordo com a palavra de Deus", sendo a excomunhão de pessoas a mais grave sentença que pode decidir.
A eucaristia só era praticada quatro vezes por ano.
Em 1542 Calvino publicou em Genebra o seu livro de catecismo: "Catéchisme de l'Église de Genève, c'est-a-dire, le formulaire d'instruire les enfants en la chrétienté". A chave do projecto de Calvino passava pela pedagogia. O seu objectivo era a profunda transformação das mentalidades. Cada resquício de superstição, de práticas de magia, ou de catolicismo era perseguido como idolatria.
O consistório, do qual Calvino fazia parte, ocupava-se desses e de outros casos. Refiram-se alguns:
  • Em 1542, uma mulher chamada Jeanne Petreman foi acusada de se recusar a participar da eucaristia, de dizer o pai-nosso em língua "romana" e de proclamar que a Virgem Maria era a sua defensora. Dizia também que se negava a acreditar noutra fé que não a sua. Foi excomungada.
  • Em 2 de setembro de 1546, apareceu em Genebra um franciscano que pedia na rua um jantar em nome de Deus e da Virgem Maria. Devemos pressupor que ele obteve o seu jantar mas foi também levado ao consistório, que logo constatou que o "papista" mal conhecia a Bíblia, além de ser inofensivo. Foi expulso da cidade, para o lado da fronteira, com os católicos.
  • A 23 de junho de 1547 compareceram perante o consistório várias mulheres que tinham sido apanhadas a dançar - uma delas era a esposa de um dos membros do consistório. O caso ganhou contornos de escândalo. As mulheres foram condenadas a alguns dias de prisão, apesar de vários apelos. Em reacção à decisão, foram colocados na cidade cartazes contra Calvino. O autor dos cartazes, Jacques Gruet, foi torturado. Depois de confessar a sua autoria, foi executado.
  • Em 1548, Louis Le Barbier foi interrogado sobre a sua fé. Declarou que não tinha fé. Entretanto, descobriram livros de bruxaria e de escórnio na sua posse. Foi admoestado perante o consistório mas não foi perseguido.
Os nomes de baptismo são regulamentados. Devem ser nomes que figuram na Bíblia. Um decreto de 22 de novembro de 1546 dispôs que certos nomes eram proibidos, entre os quais:
  • Suaire, Claude, Mama (lembram a idolatria)
  • Baptistes, Juge, Evangéliste
  • Dieu le Fils, Espoir, Emmanuel, Sauveur, Jésus (destinados apenas a nosso senhor)
  • Sépulcre, Croix, Noël, Pâques, Chrétien (nomes estúpidos ou absurdos)
O luxo e a pompa eram desprezados. Em setembro de 1558, Nicolas des Gallars, um amigo de Calvino, iniciou uma grande campanha na cidade em desprezo do supérfluo, as modas entre as mulheres e as más leituras. Foram queimados vários exemplares do livro "Amadis de Gaula", na posse de um comerciante. O zelo religioso tomava a forma de censura moral.

Peste Negra em Genebra[editar | editar código-fonte]

Em 1542, há um surto de peste negra em Genebra. A peste negra permanecia então um fenómeno incompreensível - para lidar com a epidemia, era normal que se multiplicassem os casos de feitiçaria e de rituais contra a peste. Este tipo de práticas já eram conhecidos em Genebra antes da reforma e, tal como antes, os protestantes replicavam com a perseguição, tortura e morte dos suspeitos. Aquelas que são identificadas como bruxas são queimadas vivas, enquanto se propaga a ideia de que estas desgraças são um castigo de Deus.
Em 1542, o filho de Calvino, Jacques, morreu pouco depois de nascer em 28 de julho.
A caça às bruxas foi um fenômeno da Idade Moderna, uma espécie de onda persecutória que atingiu a Europa Central e Ocidental. Era praticada principalmente pelos magistrados das cidades. Por conta das epidemias que surgiram em Genebra, em 1545, foram julgados 43 "fomentadores de peste", dos quais 39 foram executados (90 % dos casos). [6]

Crescimento demográfico[editar | editar código-fonte]

A partir de 1542 e sobretudo na década de 1550, a cidade de Genebra conheceu um grande crescimento demográfico, com a chegada de refugiados franceses, protestantes perseguidos em França. Consequentemente, há uma fase de expansão económica (relojoaria e tecelagem) e a língua francesa começoy a ter preponderância sobre o dialecto franco-provençal da região.
Mas também foi uma época marcada pelo crescimento de sentimentos xenófobos, em parte devidos a ressentimentos contra Calvino:
  • Em janeiro de 1546 foi preso Pierre Ameaux, que tinha injuriado publicamente Calvino, ao referir-se a este como um "picard", pregador de uma falsa fé.
  • Um outro senhor Ameaux foi preso mais tarde por razões semelhantes. Este senhor tinha boas razões para não gostar do extremo zelo religioso imposto por Calvino, já que era fabricante de cartas de jogo. Foi condenado a percorrer a cidade de uma ponta à outra, descalço, em camisa, com uma vela na mão.
  • 23 de setembro de 1547, François Favre compareceu em tribunal por ter afirmado que Calvino se auto-nomeara bispo de Genebra e que os franceses tinham escravizado a sua cidade natal.
  • Mais tarde, em 1548, um senhor chamado Nicole Bromet declarou que os franceses deveriam ser todos colocados num barco e enviados pelo rio Reno abaixo.
Em 1547, Henrique II de França sucedeu a Francisco I. Henrique foiá um rei menos reconhecido, em comparação com Francisco. Foi caracterizado como menos carismático, menos entusiasta pelas artes e ciências, mais introvertido e frio.
Em 29 de março de 1549 morreu Idellete Calvino, após doença [4] . Calvino não tornou a casar. Dedicou-se ainda mais decididamente ao trabalho.
Em 1550, a repressão dos huguenotes em França cresceu. Foi estabelecida a chambre ardente. A censura foi fortalecida.

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