Jesus Cristo -2

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Entrada final em Jerusalém

Nos quatro evangelhos canónicos, a entrada final de Jesus em Jerusalém tem lugar durante o início da última semana da sua vida, poucos dias antes da Última Ceia, marcando o início da narrativa da Paixão.[187] [188] Marcos e João identificam o dia da entrada em Jerusalém como sendo domingo, enquanto que Mateus indica que foi uma segunda; Lucas não indica o dia.[189] [190] [191] Depois de deixar Betânia, Jesus monta num burro em direção a Jerusalém. Pelo caminho, a população estende à sua frente capas e pequenos ramos, ao mesmo tempo que canta parte dos Salmos 118:25-26[192] [193] [194] A multidão em ânimo que saudava Jesus ao entrar em Jerusalém ajudou a aumentar a animosidade contra ele por parte das instituições locais.[195]
Nos três evangelhos sinópticos, à entrada em Jerusalém segue-se a Purificação do Templo, durante a qual Jesus expulsa os cambistasdo templo, acusando-os de o terem tornado um covil de ladrões através das suas atividades comerciais. Este é o único relato de todos os evangelhos em que Jesus recorre a força física.[196] [197] João 2:13 inclui uma narração semelhante decorrida muito mais cedo, pelo que existe debate entre académicos sobre se a passagem se refere ao mesmo episódio.[198] [197] Os sinópticos descrevem uma série de parábolas e sermões bastante conhecidos, como o Tostão da Viúva ou a Profecia da Segunda Vinda, que decorreram ao longo dessa semana.[199] [200]
Os sinópticos registam episódios de conflitos entre Jesus e os anciãos judeus durante a Semana Santa, como o da autoridade de Jesus questionada e as críticas aos fariseus, nos quais Jesus os critica e acusa de hipocrisia.[201] [202] Judas Iscariotes, um dos doze apóstolos, aborda os anciãos e negoceia o pagamento de uma recompensa de trinta moedas de prata, pela qual se compromete a trair Jesus e a entregá-lo às autoridades.[203] [204]

Última Ceia

Ver artigo principal: Última Ceia

Última Ceia, numa pintura de Juan de Juanesséculo XVI
A Última Ceia é a última refeição que Jesus partilha com os seus doze apóstolos em Jerusalém antes da sua crucificação. A Última Ceia é mencionada nos quatro evangelhos canónicos, sendo também referida na Primeira Epístola aos Coríntios de Paulo (Coríntios 11:23).[65][205] [206] Durante a refeição, Jesus prevê que um de seus apóstolos o trairá.[207] Apesar de cada apóstolo ter afirmado que não o iria trair, Jesus reitera que o traidor seria um dos presentes. Mateus 26:23-25 e João 13:26-27 identificam especificamente Judas como traidor.[65] [208] [209]
Nos sinópticos, Jesus reparte o pão pelos discípulos ao mesmo tempo que diz: "Isto é o meu corpo, que por vós é dado; fazei isto em memória de mim." Depois fê-los beber vinho por um cálice, dizendo: "Este cálix é o Novo Testamento no meu sangue, que é derramado por vós." (Lucas 22:19-20).[65] [210] O sacramento cristão da Eucaristia baseia-se neste evento.[211] Embora o Evangelho de João não inclua uma descrição do ritual do pão e do vinho durante a Última Ceia, a maior parte dos académicos concorda que o Discurso do Pão da Vida (João 6:58-59) possui um carácter eucarístico e se relaciona com as narrativas dos evangelhos sinópticos e com os textos de Paulo sobre a Última Ceia.[212]
Em todos os evangelhos, Jesus prevê que Pedro negará que o conhece por três vezes antes de o galo cantar na manhã seguinte.[213] [214] Em Lucas e João, a profecia é feita durante a Ceia (Lucas 22:34João 22:33). Em Mateus e Marcos, a profecia é feita após a Ceia, sendo também profetizado que Jesus será abandonado por todos os seus discípulos (Mateus 26:31-34Marcos 14:27-30).[215] O Evangelho de João oferece o único relato de Jesus a lavar os pés dos discípulos antes da refeição.[105] João também inclui um longo sermão de Jesus, preparando os discípulos (agora sem Judas) para a sua partida. Os capítulos 14 a 17 do Evangelho de João são conhecidos por Discurso de despedida e são uma fonte significativa de conteúdos cristológicos.[216] [217]

Agonia no jardim, traição e prisão

Ver artigos principais: Agonia no JardimBeijo de Judas e Prisão de Jesus

Beijo de Judas e da prisão de Jesuspor Caravaggioséculo XVII
Após a Última Ceia, Jesus dá um passeio para rezar, acompanhado pelos discípulos. Mateus e Marcos identificam o local como sendo ojardim do Getsémani, enquanto Lucas o identifica como sendo o Monte das Oliveiras.[218] [219] Judas aparece no jardim acompanhado por uma multidão, entre a qual se encontram clérigos judaicos, anciãos e pessoas armadas. Judas beija Jesus para o identificar à multidão, que então o prende.[220] [221] Tentando impedi-los, um dos discípulos de Jesus empunha uma espada para cortar a orelha de um homem.[222] [223] Lucas afirma que Jesus cura a ferida por milagre, enquanto João e Mateus afirmam que Jesus critica o ato violento, ao mesmo tempo que incentiva os discípulos a não resistir à prisão. Em Mateus 26:52 Jesus afirma: "Todos os que lançarem mão da espada à espada morrerão."[224] [225] Após a prisão de Jesus, os seus discípulos escondem-se e Pedro, quando interrogado, por três vezes nega conhecer Jesus.[226] Após a terceira negação ouve-se o galo cantar e Pedro, ao se lembrar da profecia, chora em amargura.[213]

Julgamentos pelo Sinédrio, Herodes e Pilatos

Depois de ser preso, Jesus é levado para o Sinédrio, um corpo jurídico judaico.[227] O texto dos evangelhos difere nos detalhes dos julgamentos.[228] Em Mateus 26:57Marcos 14:53 e Lucas 22:54, Jesus é levado para a casa do sacerdote Caifás, onde é espancado durante a noite. De manhã cedo, os clérigos e escribas levam Jesus ao tribunal.[229][230] [231] João 18:12-14 afirma que Jesus é levado primeiro a Anás, sogro de Caifás, e depois ao sumo sacerdote, sem menção ao Sinédrio.[232] [233] [231]
Durante os julgamentos, Jesus pouco falou, não articulou nenhuma defesa e respondeu de forma vaga às questões dos clérigos, o que levou um oficial a esbofeteá-lo. Em Mateus 26:62, a falta de resposta de Jesus leva a que Caifás lhe pergunte: "Não respondes coisa alguma ao que estes depõem contra ti?"[234] [235] [231] Em Marcos 14:61 o sumo sacerdote pergunta a Jesus: "És Tu o Cristo, Filho do Deus Bendito?" Jesus responde "Eu o sou", e em seguida profetiza a vinda do Filho do Homem.[22] Esta provocação faz com que Caifás se irrite e rasgue a própria túnica, acusando Jesus de blasfémia. Em Mateus e Lucas, a resposta de Jesus é mais ambígua.[22] [236] EmMateus 26:64 responde: "Tu o disseste", e em Lucas 22:70 diz: "Vós dizeis que eu sou".[237] [238]
Ao levar Jesus para o tribunal de Pilatos, os anciãos pedem ao governador que julgue e condene Jesus, acusando-o de se proclamar o Rei dos Judeus.[231] O uso do termo "rei" é essencial na discussão entre Jesus e Pilatos. Em João 18:36 Jesus declara: "O meu reino não é deste mundo", mas não nega inequivocamente ser o Rei dos Judeus.[239] [240] Em Lucas 23:7-15 Pilatos apercebe-se de que Jesus é um galileu, estando portanto na jurisdição de Herodes.[241] [242] Pilatos envia Jesus a Herodes para ser julgado,[243] mas este mantém o silêncio face às perguntas de Herodes. Herodes e os seus soldados escarnecem Jesus, vestem-lhe um manto luxuoso para o fazer parecer um rei, e o levam de volta a Pilatos,[244] que reúne os anciãos e anuncia que não considerava este homem culpado.[245]
De acordo com um costume da época, Pilatos permite que a multidão escolha um prisioneiro para ser libertado. Dá a escolher entre Jesus e um assassino chamado Barrabás. Persuadida pelos anciãos (Mateus 27:20), a multidão escolhe libertar Barrabás e crucificar Jesus.[246] Pilatos escreve um sinal onde se lê: "Jesus Nazareno Rei dos Judeus",[247]abreviado para INRI nas representações do tema, para ser afixado na cruz de Jesus (João 19:9),[248] tendo em seguida flagelado e enviado Jesus para ser crucificado. Os soldados colocaram-lhe na cabeça uma coroa de espinhos, ridicularizando-o como Rei dos Judeus, e espancando-o antes de o levarem para o Calvário[249] para ser crucificado.[250] [231] [251]

Crucificação e deposição

Ver artigos principais: Crucificação de Jesus e Deposição da Cruz
A crucificação de Jesus é descrita nos quatro evangelhos canónicos. Depois dos julgamentos, Jesus é levado para o Calvário carregando a cruz. O caminho que se pensa ter sido usado é conhecido por Via Dolorosa. Os três evangelhos sinópticos indicam que Simão de Cirene foi obrigado pelos romanos a ajudar Jesus.[252] [253] Em Lucas 23:27-28 Jesus diz às mulheres no meio da multidão que o segue para não chorarem por ele, mas por si próprias e pelas suas crianças.[254] No Calvário, oferecem a Jesus um preparado analgésico. De acordo com Mateus e Marcos, Jesus recusa.[255] [256]
Os soldados crucificam Jesus e removem a sua roupa. Acima da sua cabeça na cruz estava a inscrição de Pilatos, "Jesus Nazareno Rei dos Judeus",[257] ridicularizado por soldados e pessoas que passavam a pé. Jesus é crucificado entre dois ladrões condenados, um dos quais ataca Jesus, enquanto outro o defende.[258] [259] Os soldados romanos partem as pernas a ambos os ladrões, uma técnica usada para acelerar a morte na cruz, mas não chegam a partir as de Jesus, uma vez que este já se encontra morto. Em João 19:34um soldado perfura Jesus com uma lança, de cuja ferida brota água.[260] Em Mateus 27:51-54, quando Jesus morre, a cortina pesada do Templo volve-se e um terramoto abre os túmulos. Aterrorizado pelo evento, um centurião romano afirma que Jesus era de facto o Filho de Deus.[261] [262]
No mesmo dia, José de Arimateia, com a permissão de Pilatos e a ajuda de Nicodemusremove o corpo de Jesus da cruz, envolve-o em roupas lavadas e enterra-o num túmulo de pedra talhada.[263] Em Mateus 27:62, no dia seguinte os judeus pedem a Pilatos para o túmulo ser selado com uma pedra e vigiado, de modo a assegurar que o corpo aí permaneça.[264] [265]

Ressurreição e ascensão

O texto do Novo Testamento sobre a ressurreição de Jesus afirma que no primeiro dia da semana após a crucificação (geralmente interpretado como sendo o domingo), o seu túmulo foi descoberto vazio e que os seus discípulos o encontram ressuscitado dentre os mortos. Os discípulos chegaram ao túmulo de manhã cedo e encontram um ou dois seres (homens ou anjos) vestidos com túnicas brancas. Marcos 16:9 e João 20:15 indicam que Jesus aparece primeiro a Maria Madalena, e Lucas 24:1 afirma que ela é uma dosmirróforos (na tradição oriental) ou das Três Marias (na ocidental).[266] [267]
Depois de descobrirem o túmulo vazio, Jesus realiza uma série de aparições aos discípulos.[268] Entre elas está a Dúvida de Tomé e aaparição na estrada aos Emaús, em que Jesus encontra dois discípulos. A segunda pesca milagrosa é um milagre no mar da Galileia, após o qual Jesus encoraja Pedro a servir os seus seguidores.[269] [270]
Antes de ascender ao Céu, Jesus instrui os discípulos a espalhar a palavra sobre os seus ensinamentos em todas as nações do mundo.Lucas 24:51 afirma que Jesus é então levado ao Céu. O relato da ascensão é elaborado em Atos 1:1-11 e mencionado em Timóteo 3:16. Nos Atos, quarenta dias depois da Ressurreição, quando os discípulos olham para cima, encontram Jesus elevado, tendo sido levado por uma nuvem. Pedro 3:22 afirma que Jesus foi levado para o Céu e é agora a mão direita de Deus.[271]
Os Atos dos Apóstolos descrevem várias aparições de Jesus em visões após a sua Ascensão. Atos 7:55 descreve uma visão vivenciada por Santo Estêvão pouco antes de morrer.[272] Na estrada para Damasco, o apóstolo Paulo é convertido ao cristianismo depois da visão de uma luz ofuscante e de ter ouvido uma voz dizer: "Eu sou Jesus, a quem tu persegues" (Atos 9:5).[273] [274] Em Atos 9:10-18, Jesus instrui Ananias de Damasco a curar Paulo. É o último diálogo com Jesus citado na Bíblia até ao Livro da Revelação,[273] [274] no qual um homem chamado João vivencia uma revelação de Jesus sobre os últimos dias.[275]

Perspetiva histórica

Ver artigo principal: Jesus histórico
Ver também: Crítica bíblica
Até ao Iluminismo os evangelhos eram geralmente vistos como relatos históricos precisos, tendo a partir de então surgido interrogações sobre a sua fiabilidade por parte de académicos e a distinção clara entre o Jesus descrito nos evangelhos e o Jesus na História.[276] A partir do século XVIII começam a ter lugar três vertentes de pesquisa académica sobre o Jesus histórico, cada uma com diferentes características e com base em diferentes critérios de investigação, os quais são muitas vezes elaborados durante a investigação que os aplica.[277] [278] Os académicos têm vindo a estudar e debater uma série de questões no que diz respeito ao Jesus histórico, como a sua existência, origem, fiabilidade histórica dos evangelhos e de outras fontes e um retrato preciso da figura histórica.

Existência

Ver artigo principal: Teoria do Mito de Jesus

Edição de 1640 da obra deFlávio Josefo, historiador romano do século I.[279]
A teoria do mito de Cristo, que questiona a existência de Jesus e a veracidade dos relatos sobre ele, apareceu no século XVIII. Alguns dos apoiantes argumentam que Jesus é um mito inventado pelos primeiros cristãos,[280] [281] [282] salientando a inexistência de quaisquer referências escritas a Jesus durante a sua vida e a relativa escassez de referências fora do contexto cristão durante o século I.[283] Ao longo do século XX, académicos como George Albert WellsRobert M. Price e Thomas Brodie têm apresentando vários argumentos que apoiam a teoria do mito de Cristo.[284] [285] [286] No entanto, na atualidade praticamente todos os académicos que estudam a Antiguidade concordam que Jesus existiu e encaram determinados eventos, como o seu batismo e crucificação, como factos históricos.[287] [288] [289] Robert E. Van Voorst e Michael Grantafirmam que os investigadores bíblicos e historiadores clássicos vêm as teorias da inexistência de Jesus como efetivamente refutadas.[15] [290]
Em resposta ao argumento de que a inexistência de fontes contemporâneas significa que Jesus não existiu, Van Voorst afirmou que "tal como é do conhecimento de qualquer estudante de História", tais argumentos pelo silêncio são "particularmente perigosos"[291] e geralmente fracassam, a não ser que um facto seja conhecido pelo autor e relevante o suficiente para ser mencionado no contexto de um documento.[292] [293] Bart D. Ehrman argumenta que embora Jesus tenha tido um enorme impacto em gerações futuras, o seu impacto na sociedade do seu tempo foi praticamente nulo. Seria portanto insensato esperar que existissem textos contemporâneos das suas ações.[294]
Ehrman refere que argumentos baseados na inexistência de evidências físicas ou arqueológicas de Jesus ou de quaisquer textos sobre ele são fracos, uma vez que também não existem tais evidências de "praticamente ninguém que tenha vivido durante o século I".[24] Teresa Okure escreveu que a existência de figuras históricas é estabelecida pela análise de referências que lhes sejam posteriores, e não por relíquias ou restos contemporâneos.[295] Diversos académicos referem o perigo de usar tais argumentos pela ignorância e geralmente consideram-nos inconclusivos ou falaciosos.[296] [297][298] Douglas Walton afirma que argumentos pela ignorância são capazes de levar a conclusões apenas em casos onde se assume que toda a nossa base de conhecimento está completa.[299]
Entre as fontes fora do contexto cristão para determinar a existência histórica de Jesus está a obra dos historiadores do século I Josefo e Tácito.[300] [301] [302] Louis H. Feldman, investigador de Josefo, afirmou que "poucos duvidaram da autenticidade" da referência de Josefo a Jesus no livro 20 de Antiguidades Judaicas, e tal facto é disputado apenas por um número muito reduzido de académicos.[303] [304] Tácito refere-se a Cristo e à sua execução por Pilatos no livro 15 da sua obra Anais. Os académicos geralmente consideram que a referência de Tácito à execução de Jesus seja simultaneamente autêntica e de valor histórico enquanto fonte independente romana.[305]

Historicidade dos eventos

Estátua de Tácito no exterior do parlamento de Viena
Codex Mediceus 68 II fol. 38, dos Anais de Tácito
senador romano e historiador Tácito escreveu sobre a crucificação de Jesus em Anais, uma História do Império Romano durante o primeiro século.
A abordagem à reconstituição histórica da vida de Jesus varia entre as abordagens maximalistas do século XIX, nas quais os relatos dos evangelhos eram aceites como evidências fiáveis sempre que possível, e as abordagens minimalistas do início do século XX, nas quais era muito difícil qualquer coisa sobre Jesus ser aceite como histórica.[306] Na década de 1950, à medida que toma lugar a segunda procura pelo Jesus histórico, a abordagem minimalista vai desaparecendo até que, no século XXI, minimalistas como Price são uma pequena minoria.[307] [308] Embora a crença na infalibilidade dos evangelhos não possa ser sustentada em termos históricos, muitos académicos desde a década de 1980 sustentam que, para além dos poucos factos que se considera serem historicamente válidos, há outros elementos da vida que Jesus que são "historicamente prováveis"[309] [310] [311] A pesquisa académica sobre o Jesus histórico moderna foca-se então na identificação dos elementos mais prováveis.[312] [313]
A maior parte dos académicos contemporâneos considera que o batismo e a crucificação de Jesus são inequivocamente factos históricos.[314] James Dunn afirma que são factos quase universalmente aceites e que "se classificam tão alto na escalada dos factos históricos dos quais é impossível duvidar ou renegar" que são quase sempre o ponto de partida para o estudo do Jesus histórico.[315] Os académicos citam o critério do embaraço, afirmando que os primeiros cristãos não teriam inventado a morte dolorosa do seu líder,[316] ou um batismo que pudesse implicar que Jesus teria cometido pecados dos quais se quisesse arrepender.[317] [318] Os académicos usam uma série de critérios para julgar a autenticidade histórica dos eventos, como o critério de coerência, a confirmação por múltiplas fontes e o critério de descontinuidade.[319] A historicidade de um evento depende também da fiabilidade da fonte. Marcos, o primeiro evangelho a ser escrito, é geralmente considerado o mais fiável em termos históricos.[320] João, o último evangelho escrito, difere consideravelmente dos evangelhos sinópticos, sendo por isso considerado o menos fiável. Por exemplo, muitos académicos não consideram que a Ressurreição de Lázaro seja histórica devido, em parte, a ser apenas mencionada em João.[321] Amy-Jill Levine refere que existe algum consenso nos traços gerais da biografia de Jesus, e que a maior parte dos académicos concorda que Jesus foi batizado por João Batista, debateu com as autoridades judaicas o tema de Deus, curou algumas pessoas, ensinou através de parábolas, angariou seguidores e foi crucificado por ordem de Pilatos.[322]

Retratos de Jesus

Ver artigos principais: Santa Face de Jesus e Acheiropoieta
A investigação moderna sobre o Jesus histórico não produziu ainda um perfil unificado da figura histórica, devido em parte à diversidade de abordagens entre os académicos.[323] Ben Witherington afirma que "existem agora tantos retratos do Jesus histórico como existem pintores académicos".[324] Bart Ehrman e Andreas Köstenbergerargumentam que, dada a escassez de fontes históricas, é difícil para qualquer académico construir um perfil de Jesus para além dos elementos básicos da sua biografia que possa ser considerado válido em termos históricos.[325] [326] Os perfis de Jesus construídos muitas vezes diferem entre si e da imagem retratada nos evangelhos.[327] [328]
Os perfis mais divulgados na investigação contemporânea podem ser agrupados segundo a forma principal como Jesus é retratado: se um profeta apocalíptico, um curandeiro carismático, um filósofo cínico, o verdadeiro Messias ou um profeta igualitário de mudanças sociais.[329] [330] Cada um destes tipos tem uma série de variantes, e alguns académicos rejeitam os elementos básicos de alguns perfis.[331] No entanto, os atributos descritos em cada um dos perfis por vezes sobrepõem-se, e os investigadores que discordam de alguns atributos por vezes concordarm com outros.[332]

Língua, etnia e aparência


Doze representações de Jesus em diversas regiões. A representação da etnia de Jesus tem sido influenciada pelo contexto cultural.[333] [334]
Jesus cresceu na Galileia, sendo nessa região que grande parte do seu ministério teve lugar.[335] Entre as línguas faladas na Galileia e Judeia durante o primeiro século d.C. estão o aramaicohebraico e grego, sendo o aramaico predominante.[336] [337] A maior parte dos académicos concorda que, no início do século, o aramaico era a língua-mãe de praticamente todas as mulheres na Galileia e Judeia.[338] A maior parte dos académicos apoia a teoria de que Jesus falava aramaico, podendo também ter falado hebraico e grego.[336] [337] [339] Dunn afirma que há um consenso substancial de que Jesus tenha pregado em aramaico.[340]
Os académicos modernos concordam que Jesus foi um judeu que viveu na Palestina durante o século I.[341] No entanto, no contexto contemporâneo o termo "judeu" ("Ioudaios" no grego do Novo Testamento) pode referir-se tanto à religião judaica, como à etnia judaica, como a ambas.[nota 6] [343] Numa revisão do estado da arte do conhecimento contemporâneo, Levine escreve que toda a questão da etnia está "carregada de questões difíceis" e que "para além de reconhecer que «Jesus era judeu», raramente a investigação esclarece o que significa «ser judeu»".[344]
O Novo Testamento não fornece nenhuma descrição da aparência física de Jesus antes da sua morte, sendo na generalidade indiferente à questão da raça e nunca se referindo aos traços das pessoas que menciona.[345] [346] [347] O Livro do Apocalipse descreve numa visão as feições de Jesus glorificado (Revelação 1:13-16), mas a visão refere-se a Jesus numa forma divina, já depois da sua morte e ressurreição.[348] [349]Provavelmente, Jesus assemelhar-se-ia a qualquer judeu seu contemporâneo e, de acordo com alguns investigadores, seria provável que tivesse uma aparência musculada devido ao seu estilo de vida itinerante e ascético.[350] James H. Charlesworth afirma que o rosto de Jesus era "provavelmente de tez escura e bronzeada" e que a sua estatura "pode ter sido de 1,65 a 1,70 m."[351]

Arqueologia

Apesar da inexistência de vestígios arqueológicos que sejam indubitavelmente associados a Jesus, a investigação no século XXI tem-se interessado cada vez mais por recorrer à arqueologia de modo a obter maior compreensão do contexto sócio-económico e político da vida de Jesus.[352] [353] [354] Charlesworth afirma que hoje em dia poucos investigadores seriam capazes de ignorar algumas descobertas arqueológicas que fornecem dados sobre o quotidiano da Galileia e Judeia durante a época de Jesus.[354] Jonathan Reed afirma que a principal contribuição da arqueologia para o estudo do Jesus histórico é a reconstrução do seu mundo social.[355]
David Gowler afirma que o estudo interdisciplinar com recurso a arqueologia, análise textual e contexto histórico pode esclarecer determinados aspetos sobre Jesus na História.[356] Um exemplo são as investigações arqueológicas em Cafarnaum, uma cidade bastante referida no Novo Testamento, mas da qual se fornecem poucos detalhes.[357] No entanto, as evidências arqueológicas recentes mostram que, ao contrário do que se acreditava, Cafarnaum era pequena e relativamente pobre, e nem sequer tinha um fórum ou ágora.[356] [358] Esta descoberta arqueológica apoia a perspectiva académica de que Jesus advogava a partilha de riqueza entre os mais desfavorecidos naquela região da Galileia.[356]

Perspetivas religiosas

À exceção dos seus próprios discípulos e seguidores, os judeus contemporâneos de Jesus rejeitavam a crença de que ele pudesse ser o Messias, tal como é ainda rejeitada hoje em dia pela grande maioria dos judeus. Ao longo dos séculos, Jesus tem sido tema de amplo debate e inúmeras publicações por parte de teólogos, concílios ecuménicos e reformistas. As denominações cristãs e cismas são muitas vezes definidas ou caracterizadas em função da descrição que apresentam de Jesus. Ao mesmo tempo, Jesus tem um papel proeminente entre crentes de outras religiões, como os maniqueístasgnósticos e muçulmanos.[359] [360] [361]

Perspetivas cristãs

Ver artigo principal: Cristologia

Codex Vaticanus, considerado o melhor manuscrito grego do Novo Testamento.
Jesus é a figura central do cristianismo.[362] Embora entre os cristãos haja diferentes pontos de vista sobre Jesus, é possível resumir as crenças partilhadas entre as principais denominações de acordo com os seus textos.[363] [364] [365] Os pontos de vista cristãos sobre Jesus têm origem em várias fontes, entre as quais os evangelhos canónicos e cartas do Novo Testamento, como as epístolas paulinas e os documentos joaninos. Estes documentos resumem as crenças fundamentais sobre Jesus por parte dos cristãos, incluindo a sua divindade, humanidade e vida terrena, e que é Cristo e o Filho de Deus.[366] Apesar de partilharem grande parte das crenças, nem todas as denominações cristãs concordam com todas as doutrinas, e existem várias diferenças entre si em termos de crença e ensinamentos que persistiram ao longo de séculos.[367]
O Novo Testamento afirma que a ressurreição de Jesus é o fundamento da fé cristã (Coríntios 15:12).[368] Os cristãos acreditam que pela sua morte e ressurreição, os seres humanos se podem reconciliar com Deus, sendo-lhes oferecida salvação e a promessa de vida eterna.[369] Recordando as palavras de João Batista a seguir ao batismo de Jesus, estas doutrinas por vezes denominam-no Cordeiro de Deus, por ter sido sacrificado para cumprir o seu papel enquanto servo de Deus.[370] [371] Jesus é assim visto como o novo e último Adão, cuja obediência contrasta com a desobediência de Adão.[372] Os cristãos veem Jesus como um modelo de vida, sendo encorajados a imitar a sua vida focada em Deus.[373]
Muitos cristãos acreditam que Jesus foi ao mesmo tempo humano e o Filho de Deus. Embora a sua natureza seja alvo de debate teológico,[nota 7] Os cristãos trinatáriosacreditam que Jesus é o Logos, a encarnação de Deus e Deus, o Filho, simultaneamente divino e humano. No entanto, a doutrina da Trindade não é universalmente aceiteentre os cristãos, sendo rejeitada por denominações como A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, as Testemunhas de Jeová ou a Ciência Cristã.[374] [375] Os cristãos veneram não apenas Jesus, mas também o seu nome. A devoção ao Santo Nome de Jesus remonta aos primeiros dias do cristianismo.[376] [377] Estas devoções e comemorações existem tanto no cristianismo ocidental como no oriental.[378]


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