A pessoa criativa é ousada e exigente. Quando sofre um golpe da vida, ela não reage simplesmente caindo e permanecendo no chão. Ao contrário, ela percebe o golpe como uma oportunidade e aproveita as dificuldades para inovar, para ouvir suas intuições e dar à experiência respostas originais.
Partir para uma vida criativa requer disposição para enfrentar desafios. Acima de tudo, exige a ousadia de quebrar velhos padrões e costumes que nos fazem andar em círculo. Criatividade é sinônimo de auto invenção e audácia, duas palavras que, quando combinadas, nos ajudam a enfrentar a realidade de forma mais livre, com a certeza de que nosso potencial é suficiente para isso.
Quase sempre, quando abordamos a questão da inovação e a importância do uso de uma mente criativa, assumimos que essa empreitada exige apenas a capacidade de gerar ideias novas e diferentes. No entanto, essa visão das coisas é restritiva. A criatividade vai além do universo cognitivo, porque o que ela exige de nós é: ação. Essa foi a conclusão alcançada na última conferência mundial sobre o assunto, recentemente realizada no Instituto Marconi de Criatividade, em Bolonha, Itália. Uma ideia é inútil se não for posta em prática. Um projeto não pode ser realizado se não combinarmos compromisso, responsabilidade e ousadia.
Por exemplo, Sherlock Holmes nunca teria existido se o escritor Conan Doyle não tivesse trabalhado meticulosamente em seus escritos, para isso até mesmo relegando a um segundo plano o seu trabalho como médico. Beethoven, por sua vez, compôs a Nona Sinfonia quando já estava praticamente surdo. Ambos são bons exemplos de que ser criativo é mais do que ser apenas imaginativo. É preciso tenacidade, ousadia e até sacrifício.
“Se você ouvir uma voz lá dentro que diz ‘você não pode pintar’, então pinte, e logo essa voz será reduzida ao silêncio” – Vincent Van Gogh.
Parta para a ação
Pare de simplesmente reagir passivamente às situações que a vida lhe propõe. Comece a agir e a ousar dar início a uma vida criativa. O escritor Ray Bradbury dizia que, para criar, é preciso parar de pensar. Para ele, o pensamento é inimigo da criatividade. Simplesmente, ouse fazer. Esse conselho de Bradbury possui uma sabedoria que merece ser levada em consideração. Muitos de nós nos acostumamos a reagir passivamente à vida. Certos acontecimentos se produzem em nós, e nos limitamos a nos deixarmos levar por eles, como folhas levadas pelo vento. Nos esquecemos que, entre o estímulo e a resposta, existe um espaço de tempo muito importante no qual se encontra a nossa capacidade de ser livre. Nele está nossa oportunidade de agir de uma maneira diferente, livre e inovadora.
Estudos desenvolvidos pela American Psychological Association (APA), em colaboração com a Universidade de Amsterdam, demonstraram que o fato de darmos início a uma vida criativa melhora consideravelmente os índices de bem estar. A criatividade que se traduz pela ação nos ajuda a deixar para trás os modelos negativos de comportamento. Graças a ela, melhoramos a relação com nós mesmos, pois desejo e comportamento caminham lado a lado. Além disso, temos mais escolhas no momento em que um problema surge, e porque a pessoa criativa é aquela que, no final das contas, faz com que o mundo avance. E agora, como podemos alcançar isso? Como podemos dar início a uma vida criativa se a nossa realidade cotidiana é tão rotineira, inflexível e estruturada? Aqui estão algumas chaves:
O pensamento lateral
O pensamento lateral é um conceito introduzido por Edward de Bono em 1967 em seu livro “O uso do pensamento lateral”. Nesse trabalho, ele estabeleceu um avanço excepcional nos fundamentos da criatividade. Qual é essa proposição? O pensamento lateral nos ajuda a ver os problemas de uma nova perspectiva. Ele se encontra além do senso lógico. Nós o encontramos ao brincar com a realidade, fazendo combinações, procurando relacionamentos, desafiando e quebrando velhos padrões… Da mesma forma, essa técnica nos incentiva a provocar reflexões para escolher caminhos novos e inexplorados. Lançar mão do pensamento lateral significa ir além do conforto e da comodidade da lógica racional.
“Eu tenho de fazer isso”. Tem mesmo?
Livre-se do “Eu tenho de fazer isso”. Tem mesmo? Você pode mudar mais coisas do que pensa. Nossas mentes estão cheias do peso do dever e do “tenho de cumprir essa tarefa”. Esses são dois inimigos vorazes da criatividade. Eles nos sujeitam a a uma vida guiada por obrigações, estresse e a ansiedade de nunca cumprir esses mandatos internos.
Todos esses pensamentos devem ser desligados e reformulados. Haverá coisas que obviamente teremos que fazer. No entanto, se analisarmos cada ramificação dessas florestas mentais, perceberemos que muitas delas são inúteis. Portanto, não devemos hesitar em “podar” tudo aquilo que, em nós, nutre sofrimento desnecessário.
Experimente coisas novas, se empolgue com a ideia de começar uma vida criativa.
Para começar uma vida mais criativa, como salienta o Dr. Scott Barry Kaufman, diretor científico do Instituto de Imaginação do Centro de Psicologia Positiva da Universidade da Pensilvânia, devemos ousar fazer coisas diferentes. A criatividade não nasce em meio a cenários de pressão. A rotina oxida motivações, sonhos, ideias inovadoras e intuições.
Às vezes, não temos escolha a não ser nos afastarmos e darmos um passo atrás. Mas sermos capazes de sair da “bolha” do nosso cotidiano faz com que o mundo surja ao nosso olhar com um novo brilho, encoraja o nosso espírito a se lançar com audácia nos voos da imaginação. Mergulharmos em novas experiências significa sermos capazes de abrir nossa mente, de aprender, ler tudo o que cai em nossas mãos, conhecer novas pessoas, conectar-se a outros níveis da nossa própria realidade. O início de uma vida criativa nos ajudará a pararmos de reagir por inércia a tudo o que acontece conosco. Se algo nos atingir, não mais reagiremos por inércia, mas faremos isso de uma maneira inovadora para nos adaptarmos melhor, ganharmos ousadia e resistência. Somente assim daremos forma à realidade que mais amamos, aquela que corresponde aos nossos valores e desejos.
Selvageria agressiva começou com a sedentarização da humanidade
Nossa imagem do ser humano pré-histórico selvagem e guerreiro, que persiste até os dias atuais, na verdade, é um mito, criado na segunda metade do século 19. Pesquisas arqueológicas mostram que, na verdade, a violência coletiva surgiu com a sedentarização das comunidades e a transição de uma economia de predação para uma de produção. Foto de abertura: A “Cueva de las Manos”, no Rio Pinturas – com contornos detalhados de mãos humanas – é considerada um dos locais de habitat mais importantes para os primeiros grupos de caçadores-coletores da América do Sul. Na província de Santa Cruz, na Argentina.
6 de março de 2020, 12:58 h Atualizado em 6 de março de 2020, 14:30
Mesmo que hoje os seres humanos pré-históricos ainda sejam percebidos na imaginação popular como seres violentos em conflito perpétuo, essas sociedades eram realmente tão violentas quanto a nossa? Somente os vestígios arqueológicos podem fornecer respostas a essas questões. Para caracterizar um ato violento, os arqueólogos estudam os impactos de projéteis e lesões em ossos humanos, avaliam o estado de preservação dos esqueletos e analisam o ambiente em que foram descobertos.
Atualmente, os mais antigos traços de violência já encontrados são aqueles resultantes da prática do canibalismo. Marcas de desmembramentos, definhamento (perda de massa muscular), fraturas e calcinação foram observadas em ossos humanos paleolíticos. Essa prática relativamente rara – que apareceu há 780 mil anos e foi documentada nas montanhas da Serra de Atapuerca, na Espanha – persistiu em outras sociedades nômades de caçadores-coletores da era paleolítica, bem como entre os agropastoris neolíticos. No entanto, essa evidência da ação de um ser humano sobre o corpo de outro ser humano levanta questões: as vítimas foram mortas antes de serem devoradas? Na verdade, o canibalismo alimentar pode ser praticado em indivíduos que já estão mortos – como no endocanibalismo funerário, que consiste em devorar um membro da própria família após sua morte.
A fome, provocada por escassez de comida, parece ser o principal fator que levava as comunidades a guerrear.
Devoradores e devorados
Apenas a presença de vestígios derivados da decapitação em ossos humanos, ou ferimentos ocasionados pelo impacto de projéteis ou de objetos contundentes causando a morte, pode apoiar a hipótese de que as vítimas consumidas foram mortas de forma violenta. Na era paleolítica, essas marcas foram observadas em menos de 30 casos. A questão permanece: os “devoradores” e os “devorados” pertenciam à mesma comunidade? Embora atualmente a prática de canibalismo – tanto alimentar quanto ritual – esteja documentada em vários sítios paleolíticos, muitas vezes é difícil saber se o que ocorreu foram casos de endocanibalismo ou de exocanibalismo.
Ausência de violência coletiva
Excluindo esse contexto específico, pouco menos de 12 casos de violência – impactos de projéteis, golpes na cabeça – foram identificados em várias centenas de ossos humanos com mais de 12 mil anos. No entanto, esses ferimentos são resultado de um acidente, ou de um ato de violência durante um conflito interpessoal, intragrupo ou intergrupo? Nesses períodos iniciais, é difícil fazer a distinção. Contudo, em muitos casos, lesões como essas, causadas por um choque ou por um golpe na cabeça, haviam cicatrizado. Assim sendo, essas pessoas não foram mortas, o que tende a provar que seus ferimentos foram resultado de um acidente, ou de uma briga entre duas pessoas.
Em outros casos, a questão da identidade do agressor surge novamente – o indivíduo era membro da comunidade da vítima, ou um forasteiro? Isso continua sem resposta. Além disso, o uso de ossos humanos na fabricação de objetos domésticos ou ornamentos também levanta a questão sobre as condições da morte desses indivíduos. Na maioria desses casos, é difícil concluir que a morte foi violenta, porque os ossos poderiam facilmente comprovar um procedimento fúnebre específico.
Dados arqueológicos mostram que uma forma de violência já existia na era paleolítica, sobretudo em cerimônias que envolviam o canibalismo. No entanto, até agora não foram encontradas evidências de violência coletiva. Na maioria dos casos retidos e estudados (fora do contexto do canibalismo), apenas um indivíduo foi vítima de violência – o que pode demonstrar a existência de conflitos interpessoais (raramente fatais) ou rituais de sacrifício.
Portanto, é razoável supor que não ocorreram guerras no período paleolítico, falando em sentido estrito. Diversas razões podem explicar essa ausência – uma população pequena, um território de subsistência suficientemente rico e diversificado, a falta de recursos e uma estrutura social igualitária e menos hierárquica.
Entre esses pequenos grupos de caçadores-coletores nômades, a colaboração e o apoio mútuo entre todos os membros do clã eram necessários para sua sobrevivência. Além disso, um bom entendimento entre eles era essencial para garantir a reprodução e, portanto, a descendência. A suposta “selvageria” dos seres humanos pré-históricos é, assim, apenas um mito – criado na segunda metade do século 19 e no início do século 20 para reforçar o discurso sobre o progresso alcançado desde o nascimento da humanidade e o conceito de “civilização”. Essa imagem de seres humanos pré-históricos “violentos e belicosos” é o resultado de uma construção acadêmica popularizada por artistas e escritores.
O desenvolvimento dos conflitos
A violência coletiva parece ter surgido com a sedentarização das comunidades no final da era paleolítica, por volta do ano 13 mil a.C. no Oriente Próximo; mas, novamente, apenas um ou poucos indivíduos foram mortos. Isso pode demonstrar a existência de conflitos dentro do grupo, mas também o surgimento de sacrifícios humanos.
Dois sítios são exceções a isso: o Sítio 117 de Jebel Sahaba, na margem direita do Rio Nilo na fronteira norte do Sudão com o Egito; e Nataruk, a oeste do Lago Turkana, no Quênia. Na necrópole de Jebel Sahaba, datada entre 14.340 e 13.140 anos antes da era atual, metade dos 59 esqueletos (descobertos em 1964) de homens, mulheres e crianças de todas as idades – escavados de vários poços cobertos com lajes de pedra – indicavam que estes haviam morrido de forma violenta.
As mortes foram resultantes de golpes na cabeça, principalmente, ou após seus corpos serem trespassados por pontas de lanças ou projéteis com ponta de pedra, alguns dos quais foram encontrados incrustados nos restos mortais. Três dos homens provavelmente estavam caídos no chão quando foram mortos. Mesmo que permaneça sem resposta a questão de se todos os 59 corpos foram enterrados ao mesmo tempo, esse sítio representa o primeiro caso comprovado de violência coletiva. Foi uma violência intragrupo ou intergrupo? O debate permanece aberto.
Há cerca de 10 mil anos, em Nataruk, 27 indivíduos, incluindo homens, mulheres e crianças, provavelmente foram jogados em um pântano. Dez entre os 12 corpos perfeitamente preservados apresentavam lesões causadas por atos de violência, e dois deles, incluindo uma mulher grávida, tinham suas mãos amarradas. Descobertos pela primeira vez em 2012, longe de um local habitável, esse pequeno grupo de caçadores-coletores pode ter sido exterminado por outro grupo durante uma estadia longe de suas casas.
Da predação à produção
Vestígios de atos de violência são mais frequentes no período neolítico. Esse período foi marcado por muitas mudanças de natureza diferente. Mudanças ambientais (aquecimento global); econômicas (domesticação de plantas e animas, busca por novos territórios, excedente e armazenamento de alimentos); sociais (sedentarização, explosão da população local, surgimento de castas e de uma elite) e, no final do período, religiosas (deusas deram lugar a divindades masculinas).
Crânio de 460 mil anos mostra sinal de violência na fronte.
Em várias necrópoles, datadas entre cerca de 8.000 e 6.500 anos atrás, os tipos de armas usadas (poucos impactos de flechas) e os fragmentos de cerâmica associados aos corpos comprovam conflitos internos ou entre as aldeias. Os restos mortais dessas vítimas são testemunhas de eventos trágicos ligados a uma crise (demográfica, de governança, epidemiológica) ou à prática de rituais – fúnebres, propiciatórios, expiatórios ou fundacionais – com sacrifícios humanos às vezes seguidos de refeições canibais.
No entanto, a existência de conflitos entre dois grupos ou comunidades não pode ser descartada, como mostram algumas pinturas nas paredes de abrigos de pedra na Espanha. Datadas entre 10.000 e 6.500 anos antes da era atual, elas representam cenas de encontros armados entre grupos de arqueiros – cenas que não existiam na arte parietal paleolítica.
A mudança na economia (da predação à produção), que levou a uma mudança radical nas estruturas sociais desde o início do período, parece ter desempenhado um importante papel no desenvolvimento de conflitos. Diferentemente da exploração de recursos na natureza, a produção de alimentos permitia a opção de um excedente de alimentos, o que deu origem ao conceito de propriedade – e, consequentemente, ao surgimento de desigualdades.
Muito rapidamente, as mercadorias armazenadas despertaram inveja e provocaram lutas internas, mas também eram potenciais despojos dos conflitos entre comunidades. Como evidenciado pelo surgimento das figuras do chefe e do guerreiro (visíveis na arte rupestre e nos sepultamentos) na Europa durante o período neolítico, essa mudança na economia também conduziu a uma estrutura hierárquica nas sociedades agropastoris. O surgimento de castas e de uma elite incluía os guerreiros e, como consequência, os escravos precisavam realizar o trabalho agrícola, em especial.
Além disso, o surgimento de uma elite com seus próprios interesses e rivalidades provocou disputas internas por poder e conflitos intercomunitários. Foi apenas a partir de 5500 a.C., época marcada pela chegada de novos migrantes, que os vestígios dos conflitos entre aldeias se tornaram muito mais frequentes. Isso se proliferou na Idade do Bronze, que começou antes de 3000 a.C. Foi durante esse período, quando surgiram verdadeiras armas de guerra feitas de metal, que a guerra se institucionalizou.
As causas históricas e sociais da violência
Embora atualmente seja difícil avaliar a verdadeira extensão dos atos de violência na pré-história – uma vez que a avaliação da importância desse fenômeno provavelmente é qualificada pela situação das descobertas e dos estudos – é possível propor algumas ideias. Por um lado, parece que o número de sítios pré-históricos em que foram observados atos de violência é baixo em relação à extensão geográfica e à duração do período considerado (vários 100 mil anos).
Por outro lado, podemos concluir que, embora o comportamento violento em relação aos outros seja antigo, a guerra nem sempre existiu. Suas origens parecem estar correlacionadas com o desenvolvimento da economia de produção, que desde o início levou a uma mudança radical nas estruturas sociais.
A violência não está gravada em nossos genes. Seu surgimento tem causas históricas e sociais – o conceito de “violência primordial (original)” é um mito. A guerra não é, portanto, inseparável da condição humana, mas sim o produto das sociedades e das culturas que geram. Como mostram os estudos das sociedades humanas primitivas, quando confrontados com crises, uma comunidade é mais resiliente se for baseada em cooperação e apoio mútuo, em vez de individualismo e competição.
Quanto à realidade da vida de nossos antepassados, ela provavelmente está em algum lugar entre duas visões – ambas míticas – a hobbesiana das Aubes cruelles (Alvoradas cruéis, livro de poemas sobre a era pré-histórica do cientista e escritor Henri-Jacques Proumen, 1879-1962), e a idade de ouro do florescimento humano, imaginada pelo filósofo Jean-Jacques Rousseau.
(*) Marylène Patou-Mathis – A pesquisadora da pré-história, especialista no homem de Neandertal, Marylène Patou-Mathis é diretora de pesquisa no Centre National de la Recherche Scientifique (CNRS) da França para o Museu Nacional de História Natural de Paris.
O ódio nos tempos do corona e outros agentes da peste
O vírus não discrimina, ataca qualquer um. Mas nós, humanos, discriminamos: sobretudo na Europa, mas também em outras partes do mundo, a CoViD-19 desencadeou uma onda de ódio contra os presumidos “espalhadores”, um fato que, infelizmente, se repete com frequência ao longo da história.
A redução (momentânea) da poluição atmosférica e as mãos mais limpas do que de costume infelizmente não são os únicos efeitos colaterais do novo corona vírus. Existem outros efeitos, decididamente mais desagradáveis: o racismo, que às vezes desemboca no ódio ao próximo. Porque, se é verdade que, como aconteceu em diversos países europeus, quando as pessoas não se encontram numa situação de emergência sanitária adoram comer comida chinesa, quando tiveram de combater um vírus que chegou da China se tornaram intolerantes e violentas, e não apenas verbalmente contra inocentes cidadãos de origem chinesa. Já em outros países, os italianos, por exemplo, foram pagos com a mesma moeda, etiquetados como “espalhadores” vindos do Velho Continente.
No final de janeiro, Lou Chengwang, um jovem chinês, lançou um apelo contra o racismo provocado pela epidemia do novo corona vírus. O vídeo se tornou viral em todo o mundo, com a hashtag #imnotavirus.
Infelizmente, o ódio e o racismo desencadeados pelo temor do contágio (bem como de uma notável dose de pura ignorância) têm raízes profundas e não constituem, com certeza, uma prerrogativa exclusiva dos tempos presentes e das mídias sociais. No decurso da história foram numerosos os casos de xenofobia conectados ao aparecimento de epidemias, da Peste Negra à sífilis, do cólera ao tifo.
Em Colônia, na Alemanha, no século 14, judeus foram queimados vivos acusados de serem os “espalhadores” da peste bubônica.
A peste bubônica e os judeus
A peste bubônica, até hoje a rainha das epidemias, conhecida também como “peste negra”, explodiu na Europa diversas vezes. Na metade do século 14 provocou a morte de milhões de pessoas. Conforme o número de vítimas aumentava, os cristãos começaram a se perguntar sobre as origens daquela tremenda epidemia. Ao perceber que algumas comunidades judaicas tinham, inicialmente, sido salvas do contágio, a primeira coisa que fizeram foi atribuir a elas a culpa. Alguns afirmavam que os judeus tinham poluído os poços de água, outros diziam que queriam exterminar os cristãos envenenando o azeite e o queijo. E, dessa forma, os judeus foram golpeados não apenas pela peste, mas também pelo ódio e pelas represálias dos seus próprios concidadãos não judeus.
A sífilis de muitas nacionalidades
“As novas doenças fazem emergir as fobias mais profundas de uma cultura”, afirma William Eamon, especialista em história da ciência. Nada mais verdadeiro do que essa afirmação, e a sífilis constitui uma prova. Quando essa doença começou a se difundir, a partir do século 15, cada país europeu lançou a culpa sobre um outro país. Assim sendo, a sífilis se tornou o “mal napolitano” fora de Nápoles, “mal francês” fora da França, “mal polonês” na Alemanha e “mal alemão” na Polônia. Três séculos depois, passou a ser conhecida no Japão como “mal português” e na Pérsia como “mal turco”. Muito tempo depois se compreendeu finalmente que, contrariamente àquilo que se acreditava, a sífilis não foi importada por Cristóvão Colombo daquilo que se considerava ser “a China”, mas que ela já estava perfeitamente presente na Europa desde os tempos dos antigos gregos.
Além dos danos, o engano
Em alguns casos, o pânico e o consequente ódio dirigido aos presumidos “espalhadores” se revelaram muito contraproducentes para a luta contra a doença, como aconteceu com uma epidemia de cólera nos Estados Unidos. A doença foi chamada de “mal irlandês”, porque coincidiu com a chegada de grandes fluxos de imigrantes provenientes da Irlanda. Na tentativa de conter o contágio, os médicos aconselhavam a pessoas a não beber uísque (bebida de origem irlandesa), mas água. Nada podia estar mais errado: a bactéria do cólera proliferava exatamente nas águas contaminadas dos poços.
Manchete do jornal Luta Democrática na época do surgimento da epidemia mundial de Aids.
Aids, a maior vítima do ódio
Não podemos deixar de falar da campanha de ódio e preconceito de que foram vítimas, sobretudo nas décadas finais do século 20 (mas também até os dias de hoje), as pessoas contaminadas pelo vírus HIV. Num verdadeiro festival de ignorância, pessoas homossexuais e consumidores de drogas injetáveis passaram a ser hostilizados por um número enorme de outras pessoas pessoas como sendo responsáveis pela disseminação do vírus. A epidemia, que rapidamente se espalhou pelo mundo todo, inclusive passou a ser chamada de “peste gay”. A descoberta, afinal, de que o vírus se originou na África, entre populações de macacos, e deles foi transmitida ao ser humano, deixou claro o quanto o preconceito ignorante está arraigado até os dias de hoje nas mentes e nos corações da maioria.
Apesar dos inegáveis progressos alcançados pela ciência e pela tecnologia, essa tendência a considerar com desconfiança e temor tudo aquilo que é diferente, e a culpar o diferente pelas nossas próprias mazelas, não mudou com o tempo. O terror dos tempos medievais ainda está vivo nas entranhas de muitos.
Este vídeo mostra a inteira evolução do universo, que durou até agora 14 bilhões de anos. Cada segundo do vídeo corresponde, na realidade, a 22 milhões de anos. Da nuvem primordial às primeiras estrelas, da formação das galáxias às grandes estruturas hoje visíveis na imensidão do cosmos.
Na parte inferior da tela podemos ler o tempo transcorrido a partir do Big Bang, o evento que está ocorrendo naquela fase e quantos anos nos separam daquela época.
O vídeo é narrado pelas vozes do ator inglês Brian Cox, do astrofísico e divulgador científico norte-americano e pelo ator e diretor britânico Richard Attenborough (ma existem legendas em português, caso você precise).
O homem só aparece nos instantes finais do vídeo, porque nessa escala do tempo nós surgimos apenas na última fração de segundo.
Como umas poucas empresas de tecnologia controlam bilhões de mentes todos os dias.
Um punhado de pessoas trabalhando em umas poucas empresas de tecnologia orientam os pensamentos de bilhões de pessoas todos os dias, diz o pensador de design Tristan Harris. De notificações do Facebook a Snapstreaks e reproduções automáticas do YouTube, todos eles estão competindo por uma coisa: sua atenção. Harris compartilha como essas empresas se aproveitam de nossa psicologia para seu próprio lucro e pede um renascimento do design em que nossa tecnologia nos incentive a viver a linha do tempo que desejamos.
Tradução: Maurício Kakuei Tanaka. Revisão: Maricene Krus
Tristan Harris ajuda a indústria de tecnologia a moldar de forma mais consciente e ética o espírito humano e o potencial humano. Ele já foi chamado de “a coisa mais próxima de uma consciência que o Vale do Silício tem” pela revista The Atlantic. Antes de fundar o novo Center for Human Technology, ele era o Design Ethicist do Google, desenvolvendo uma estrutura de como a tecnologia deve “eticamente” orientar os pensamentos e ações de bilhões de pessoas nas telas.
Harris passou uma década entendendo as influências invisíveis que sequestram o pensamento e a ação humana. Com base na literatura sobre vícios, magia performativa, engenharia social, design persuasivo e economia comportamental, ele está atualmente desenvolvendo uma estrutura para a persuasão ética, especialmente no que se refere à responsabilidade moral das empresas de tecnologia.
A revista Rolling Stone nomeou Harris como uma das “25 pessoas que moldam o mundo” em 2017. Seu trabalho foi apresentado no TED, “60 Minutes”, “RealTime with Bill Maher” da HBO, “PBS NewsHour”, Recode, The Atlantic , WIRED , o New York Times , Der Spiegel , The Economist e muitos mais. Harris informou chefes de estado, CEOs de empresas de tecnologia e membros do Congresso dos Estados Unidos sobre a economia da atenção.
Vídeo da palestra de Tristan Harris no TED:
Tradução integral da palestra de Tristan Harris:
Eu quero que você imagine entrar em uma sala, uma sala de controle com um monte de pessoas, cem pessoas, curvadas sobre uma mesa com pequenos botões, e que essa sala de controle irá moldar os pensamentos e sentimentos de um bilhão de pessoas. Isso pode soar como ficção científica, mas na verdade existe agora, hoje.
Eu sei porque eu costumava ficar em uma daquelas salas de controle. Eu era um especialista em ética de design no Google, onde estudei como orientar “eticamente” os pensamentos das pessoas. Porque o que não falamos é como esse punhado de pessoas que trabalham em um punhado de empresas de tecnologia por meio de suas escolhas orientará o que um bilhão de pessoas estão pensando hoje. Porque quando você pega seu telefone e eles definem como isso funciona ou o que está no feed, estamos programando pequenos blocos de tempo em nossas mentes. Se você vir uma notificação, ela o programa para ter pensamentos que talvez não tivesse a intenção de ter.
Se você deslizar sobre essa notificação, você perderá um pouco de tempo sendo sugado por algo que talvez você não pretendia ser sugado. Quando falamos sobre tecnologia, tendemos a falar sobre isso como uma oportunidade de céu azul. Pode ir em qualquer direção. E quero levar a sério por um momento e dizer por que isso está indo em uma direção muito específica. Porque não está evoluindo aleatoriamente. Há um objetivo oculto que direciona a direção de toda a tecnologia que criamos, e esse objetivo é a corrida por nossa atenção. Porque todo site de notícias, o TED, eleições, políticos, jogos, até mesmo aplicativos de meditação têm que competir por uma coisa, que é a nossa atenção, e ela tem um limite limitado. E a melhor maneira de chamar a atenção das pessoas é saber como a mente de alguém funciona. E há um monte de técnicas persuasivas que aprendi na faculdade em um laboratório chamado Laboratório de Tecnologia Persuasiva para chamar a atenção das pessoas.
Um exemplo simples é o YouTube. O YouTube quer maximizar quanto tempo você gasta. E então o que eles fazem? Eles reproduzem automaticamente o próximo vídeo. E digamos que funcione muito bem. Eles estão aproveitando um pouco mais do tempo das pessoas. Bem, se você é o Netflix, olha para isso e diz, bem, isso está diminuindo minha participação no mercado, então vou reproduzir automaticamente o próximo episódio. Mas se você for o Facebook, você diz, isso está diminuindo toda a minha participação no mercado, então agora tenho que reproduzir automaticamente todos os vídeos do feed de notícias antes de esperar que você clique em reproduzir. Portanto, a internet não está evoluindo aleatoriamente. A razão pela qual parece que está nos sugando do jeito que está é por causa dessa corrida por atenção. Nós sabemos para onde isso vai dar. A tecnologia não é neutra, e se torna uma corrida até o fundo do tronco cerebral de quem pode ir mais fundo para obtê-la.
Deixe-me dar um exemplo de Snapchat. Se você não sabia, o Snapchat é a forma número um de comunicação entre os adolescentes nos Estados Unidos. Então, se você é como eu e usa mensagens de texto para se comunicar, o Snapchat é para adolescentes, e há, tipo, cem milhões deles que o usam. E eles inventaram um recurso chamado Snapstreaks, que mostra o número de dias consecutivos que duas pessoas se comunicaram. Em outras palavras, o que acabaram de fazer é dar a duas pessoas algo que elas não querem perder. Porque se você é um adolescente e tem 150 dias seguidos, você não quer que isso vá embora. E então pense nos pequenos blocos de tempo que isso programa na mente das crianças. Isso não é teórico: quando as crianças saem de férias, foi demonstrado que elas dão suas senhas a até cinco outros amigos para manter seus Snapstreaks funcionando, mesmo quando não podem. E eles têm, tipo, 30 dessas coisas, então eles têm que tirar fotos apenas de fotos ou paredes ou tetos apenas para passar o dia. Então nem é como se eles estivessem tendo conversas de verdade. Temos a tentação de pensar sobre isso porque, ah, eles estão apenas usando o Snapchat da maneira que costumávamos fazer fofoca ao telefone. Provavelmente está tudo bem. Bem, o que falta é que na década de 1970, quando você estava apenas fofocando ao telefone, não havia uma centena de engenheiros do outro lado da tela que sabiam exatamente como sua psicologia funcionava e orquestrava você em um vínculo duplo um com o outro.
Agora, se isso está fazendo você se sentir um pouco indignado, observe que esse pensamento simplesmente vem sobre você. A indignação é uma maneira muito boa também de chamar sua atenção, porque não escolhemos indignação. Acontece conosco. E se você for o feed de notícias do Facebook, queira ou não, você realmente se beneficia quando há indignação. Porque a indignação não marca apenas uma reação no tempo emocional, no espaço, para você. Queremos compartilhar essa indignação com outras pessoas. Então, queremos compartilhar e dizer: "Você pode acreditar no que eles disseram?" E assim, a indignação funciona muito bem para chamar a atenção, de forma que se o Facebook tivesse a opção de mostrar o feed de indignação e um feed de notícias calmo, eles gostariam de mostrar a você o feed da indignação, não porque alguém o escolheu conscientemente, mas porque funcionou melhor para chamar sua atenção. E a sala de controle do feed de notícias não é responsável por nós. É responsável apenas por maximizar a atenção. Também é responsável, por causa do modelo de negócios da propaganda, que qualquer pessoa que puder pagar mais realmente entre na sala de controle e diga: "Aquele grupo ali, quero programar esses pensamentos em suas mentes". Para que você possa mirar, você pode direcionar precisamente uma mentira diretamente às pessoas que são mais suscetíveis. E porque isso é lucrativo, só vai piorar.
Então, estou aqui hoje porque os custos são muito óbvios. Não conheço um problema mais urgente do que esse, porque esse problema está por trás de todos os outros problemas. Não é apenas tirar nossa agência para gastar nossa atenção e viver a vida que queremos, está mudando a maneira como temos nossas conversas, está mudando nossa democracia e está mudando nossa capacidade de ter as conversas e relacionamentos que queremos uns com os outros. E isso afeta a todos, porque um bilhão de pessoas tem um desses no bolso.
Então, como podemos consertar isso? Precisamos fazer três mudanças radicais na tecnologia e na nossa sociedade. A primeira é que precisamos reconhecer que somos persuadíveis. Uma vez que você começa a entender que sua mente pode ser programada para ter pequenos pensamentos ou pequenos blocos de tempo que você não escolheu, não gostaríamos de usar essa compreensão e nos proteger contra o modo como isso acontece? Acho que precisamos nos ver fundamentalmente de uma nova maneira. É quase como um novo período da história humana, como o Iluminismo, mas quase uma espécie de Iluminismo autoconsciente, de que podemos ser persuadidos, e pode haver algo que queremos proteger. A segunda é que precisamos de novos modelos e sistemas de responsabilidade para que, à medida que o mundo fica melhor e mais e mais persuasivo ao longo do tempo - porque só vai ficar mais persuasivo - que as pessoas nessas salas de controle sejam responsáveis e transparentes com o que nós queremos. A única forma de persuasão ética que existe é quando os objetivos do persuasor estão alinhados com os objetivos do persuasor . E isso envolve questionar grandes coisas, como o modelo de negócios da publicidade. Por último, precisamos de um renascimento do design, porque uma vez que você tem essa visão da natureza humana, você pode controlar a linha do tempo de um bilhão de pessoas - imagine, há pessoas que têm algum desejo sobre o que eles querem fazer e o que querem estar pensando e o que querem sentir e como querem ser informados, e todos nós somos levados a essas outras direções. E você tem um bilhão de pessoas simplesmente puxadas para todas essas direções diferentes. Bem, imagine todo um renascimento do design que tentasse orquestrar a maneira exata e mais poderosa e bem gasta de tempo para que esses cronogramas acontecessem. E isso envolveria duas coisas: uma seria proteger contra os cronogramas que não queremos experimentar, os pensamentos que não gostaríamos que acontecessem, de modo que quando aquele ding acontecer, não ter o ding que nos envia longe; e a segunda nos capacitaria a cumprir a linha do tempo que desejamos.
Deixe-me dar um exemplo concreto. Hoje, digamos que seu amigo cancele o jantar e você esteja se sentindo um pouco solitário. E então o que você faz naquele momento? Você abre o Facebook. E, nesse momento, os designers na sala de controle querem programar exatamente uma coisa, que é maximizar o tempo que você passa na tela. Agora, em vez disso, imagine se esses designers criassem uma linha do tempo diferente que fosse a maneira mais fácil, usando todos os seus dados, para realmente ajudá-lo a sair com as pessoas que você gosta? Basta pensar, aliviando toda a solidão da sociedade, se essa fosse a linha do tempo que o Facebook queria tornar possível para as pessoas. Ou imagine uma conversa diferente. Digamos que você queira postar algo supercontroverso no Facebook, o que é muito importante poder fazer, para falar sobre temas polêmicos. E agora, quando há aquela grande caixa de comentário, é quase perguntando a você, qual chave você deseja digitar? Em outras palavras, é programar uma pequena linha do tempo das coisas que você vai continuar a fazer na tela. E imagine, em vez disso, que houvesse outro botão dizendo, qual seria a maior parte do tempo bem gasto para você? E você clica em "organizar um jantar". E logo abaixo do item dizia: "Quem quer confirmar presença no jantar?" E assim você ainda terá uma conversa sobre algo controverso, mas você o teria no lugar mais poderoso da sua linha do tempo, que seria em casa naquela noite com um grupo de amigos para conversar sobre isso. Então imagine que estamos executando, tipo, localizar e substituir em todas as linhas do tempo que atualmente estão nos direcionando para mais e mais tempo de tela de forma persuasiva e substituindo todas essas linhas do tempo com o que queremos em nossas vidas.
Não tem que ser assim. Em vez de fragilizando a nossa atenção, imagine se nós usamos todos esses dados e todo esse poder e essa nova visão da natureza humana para nos dar uma capacidade sobre-humana para se concentrar e uma capacidade sobre-humana para colocar a nossa atenção para o que se preocupava e uma sobre-humano capacidade de ter as conversas de que precisamos para a democracia. Os desafios mais complexos do mundo exigem não apenas que usemos nossa atenção individualmente. Eles exigem que usemos nossa atenção e a coordenemos juntos. A mudança climática exigirá que muitas pessoas sejam capazes de coordenar sua atenção da maneira mais poderosa possível. E imagine criar uma habilidade sobre-humana para fazer isso.
Às vezes, os problemas mais urgentes e importantes do mundo não são essas coisas futuras hipotéticas que poderíamos criar no futuro. Às vezes, os problemas mais urgentes são aqueles que estão bem debaixo de nossos narizes, as coisas que já estão dirigindo os pensamentos de um bilhão de pessoas. E talvez em vez de ficarmos entusiasmados com a nova realidade aumentada e virtual e essas coisas legais que podem acontecer, que estarão suscetíveis à mesma corrida por atenção, se pudéssemos consertar a corrida por atenção naquilo que já está em um bolsos de bilhões de pessoas. Talvez, em vez de ficar empolgado com os novos e interessantes aplicativos educacionais sofisticados, poderíamos consertar a maneira como as mentes das crianças estão sendo manipuladas para enviar mensagens vazias de um lado para outro.
Talvez em vez de nos preocuparmos com futuras inteligências artificiais em fuga que estão maximizando para um objetivo, pudéssemos resolver a inteligência artificial em fuga que já existe agora, que são esses feeds de notícias maximizando para uma coisa. É quase como se, em vez de fugir para colonizar novos planetas, pudéssemos consertar aquele em que já estamos.
Resolver esse problema é uma infraestrutura crítica para resolver todos os outros problemas. Não há nada em sua vida ou em nossos problemas coletivos que não exija nossa capacidade de colocar nossa atenção onde nos importamos. No final de nossas vidas, tudo que temos é nossa atenção e nosso tempo. Qual será o tempo bem gasto para o nosso?
Chris Anderson: Tristan, obrigado. Ei, fique aqui um segundo. Em primeiro lugar, obrigado. Eu sei que pedimos a você para fazer esta palestra em um prazo muito curto, e você teve uma semana muito estressante para organizar tudo isso, então, obrigado. Algumas pessoas que estão ouvindo podem dizer, você reclama é vício, e todas essas pessoas fazendo essas coisas, para elas é realmente interessante. Todas essas decisões de design criaram um conteúdo de usuário incrivelmente interessante. O mundo está mais interessante do que nunca. O que há de errado nisso?
Tristan Harris: Eu acho muito interessante. Uma maneira de ver isso é se você for apenas o YouTube, por exemplo, você quer sempre mostrar o próximo vídeo mais interessante. Você quer ficar cada vez melhor na sugestão do próximo vídeo, mas mesmo se pudesse propor o próximo vídeo perfeito que todos gostariam de assistir, seria apenas melhor e melhor em mantê-lo preso à tela. Então, o que está faltando nessa equação é descobrir quais seriam nossos limites. Você gostaria que o YouTube soubesse algo sobre, digamos, adormecer. O CEO da Netflix disse recentemente: "nossos maiores concorrentes são Facebook, YouTube e sono." E então o que precisamos reconhecer é que a arquitetura humana é limitada e que temos certos limites ou dimensões de nossas vidas que queremos ser honrados e respeitados, e a tecnologia pode ajudar a fazer isso.
CA: Quero dizer, você poderia argumentar que parte do problema aqui é que temos um modelo ingênuo da natureza humana? Muito disso é justificado em termos de preferência humana, onde temos esses algoritmos que fazem um trabalho incrível de otimização para a preferência humana, mas qual preferência? Existem as preferências de coisas com as quais realmente nos importamos quando pensamos sobre elas, em comparação com as preferências daquilo em que apenas clicamos instintivamente. Se pudéssemos implantar essa visão mais matizada da natureza humana em cada projeto, isso seria um passo à frente?
TH: Com certeza. Quer dizer, acho que agora é como se toda a nossa tecnologia fosse basicamente apenas perguntar ao nosso cérebro de lagarto qual é a melhor maneira de impulsivamente levá-lo a fazer a próxima coisa mínima com seu tempo, em vez de perguntar a você em sua vida o que faríamos será a maior parte do tempo bem gasto para você? Qual seria o cronograma perfeito que poderia incluir algo mais tarde, seria um tempo bem gasto para você aqui no TED em seu último dia aqui?
CA: Então, se o Facebook, o Google e todos nos dissessem primeiro: "Ei, você gostaria que otimizássemos o seu cérebro reflexivo ou o cérebro de lagarto? Você escolhe."
TH: Certo. Essa seria uma maneira. Sim.
CA: Você disse persuasão, é uma palavra interessante para mim porque, para mim, existem dois tipos diferentes de persuasão. Há a persuadibilidade de que estamos tentando agora da razão e pensando e argumentando, mas acho que você está quase falando sobre um tipo diferente, um tipo mais visceral de persuadibilidade , de ser persuadido sem nem mesmo saber que está pensando .
TH: Exatamente. A razão pela qual me importo tanto com esse problema é que estudei em um laboratório chamado Laboratório de Tecnologia Persuasiva em Stanford, que ensinou [os alunos a reconhecer] exatamente essas técnicas. Há conferências e workshops que ensinam às pessoas todas essas maneiras secretas de chamar a atenção das pessoas e orquestrar a vida delas. E é porque a maioria das pessoas não sabe que existe que essa conversa é tão importante.
CA: Tristan, você e eu, nós dois conhecemos muitas pessoas de todas essas empresas. Na verdade, há muitos aqui na sala e não sei sobre você, mas minha experiência com eles é que boas intenções não faltam. As pessoas querem um mundo melhor. Eles estão realmente - eles realmente querem isso. E eu não acho que você está dizendo que essas pessoas são más. É um sistema em que existem consequências indesejadas que realmente escaparam ao controle -
TH: Desta corrida por atenção. É a clássica corrida para o fundo do poço, quando você precisa chamar a atenção, e é muito tensa. A única maneira de conseguir mais é ir mais para baixo no tronco cerebral, para ir mais baixo na indignação, ir mais fundo na emoção, ir mais fundo no cérebro do lagarto.
CA:Bem, muito obrigado por nos ajudar a ficar um pouco mais sábios sobre isso.