ERRAR É HUMANO. PERSEVERAR NO ERRO… TAMBÉM
Por que repetimos sempre os mesmos erros? Aqui estão os mecanismos psicológicos que tantas vezes nos fazem tropeçar na mesma decisão equivocada.
2 DE JULHO DE 2017 ÀS 19:21 // 247 NO TELEGRAM // 247 NO YOUTUBE
Por: Luis Pellegrini
Vocês veem essas rosquinhas recobertas de glacês e chocolates que aparecem na foto de abertura desta matéria? Impossível resistir às suas cores, imediatamente associadas a sabores que conhecemos e apreciamos. Dá água na boca. Mas, depois de sermos mais uma vez vencidos pela tentação da gula, tudo que nos resta é um desagradável sentimento de culpa e remorso. Isso já nos aconteceu centenas, milhares de vezes, e apesar disso toda vez que a oportunidade aparece, caímos novamente na arapuca. Acontece com a comida-lixo oferecida nas hamburguerias, mas também com as compras de impulso nos shoppings, as escolhas no restaurante e inclusive… na escolha de um parceiro ou parceira de vida. Por que repetimos sempre os mesmos erros?
É uma forma de consolação
Um artigo recentemente publicado na revista The Atlantic analisa três mecanismos responsáveis pelo fenômeno, que é muito mais comum do que se pensa. O primeiro: quando erramos nos sentimos culpados, e quando nos sentimos culpados tendemos a ser mais indulgentes com nós mesmos. Assim, acabamos errando de novo: em uma série de experimentos descritos no Journal of Consumer Psychology, foi solicitado a algumas pessoas que recordassem todas as vezes em que foram capazes de resistir ou, ao contrário, cederam à tentação de realizar uma compra desnecessária.
Aos voluntários foi pedido, depois, calcular quanto gastaram para adquirir um objeto muito desejado: surpreendentemente, quem se lembrava das vezes em que já caíra em tentação se declarava também estar disposto a repetir a dose, gastando novamente aquela soma de dinheiro para comprar o mesmo objeto desnecessário! O fato de ter errado no passado não elimina o desejo de fazê-lo novamente.
A auto-sabotagem é constante
O segundo mecanismo tem a ver com o modo como enfrentamos uma situação de erro. Depois de cometer um erro, o cérebro tende a se tornar mais lento no momento de enfrentar novamente aquela escolha, como se estivesse avaliando as possibilidades à disposição e se perguntando o que deu errado no passado. Trata-se de uma reflexão que concentra e focaliza todas as energias da mente na lembrança do erro, desviando a atenção da nova escolha que se deve fazer.
Por fim, no terceiro mecanismo, diversos estudos demonstraram que o cérebro tende a prestar atenção particular aos estímulos que no passado se mostraram agradáveis, até mesmo quando já não o são. Eis porque, por exemplo, é tão difícil resistir a um doce hipercalórico (ou ao namorado errado): se, em algum momento do passado, eles geraram dopamina – um neurotransmissor ligado ao prazer – no cérebro, teremos mais dificuldade para nos recordarmos da indigestão que vem a seguir na forma de um sentimento de culpa.
Dicas que ajudam a desenvolver o autocontrole
1 «Posso resistir a tudo, menos às tentações”, dizia Oscar Wilde. Mas a ciência descobriu que o autocontrole, ou seja a capacidade de refrear os impulsos (fome, sexo, agressividade, vontade de comprar, preguiça, etc), é fundamental. Não apenas por motivos religiosos, como ensinam várias religiões, mas também com objetivos muito mais terrenos, como gozar de uma boa saúde e viver melhor. As vantagens do autodomínio são notáveis: quem exercita a força de vontade em um determinado campo (na dieta, por exemplo) torna-se mais determinado também em outros campos (para aprender a tocar piano, por exemplo). O autocontrole, portanto, pode ser treinado. Mas treinamento e educação não são tudo: as pesquisas descobriram que o autocontrole depende de várias outras causas insuspeitáveis. Elas vão desde o sexo… até as reservas de açúcares no organismo.
2 Lobos frontais, os freios do cérebro. As áreas que regulam o autocontrole são as dos lobos cerebrais frontais (marcados em azul, na imagem), sobretudo o lobo direito. Quando essas áreas são lesadas, as pessoas se tornam incapazes de controlar as emoções e perdem os freios inibidores. Essas regiões frontais são também a sede da memória operativa: um registro mental no qual mantemos as informações pelo tempo necessário à execução de uma tarefa. Quando a memória operativa é muito empenhada na execução de uma tarefa (por exemplo, a preparação para um exame vestibular), o autocontrole é mais difícil e nos tornamos mais vulneráveis às tentações, dos acessos de ira até a compulsão de comer sem parar. Os lobos frontais chegam à maturidade ao redor dos vinte anos e se tornam menos eficientes com a idade: isso pode explicar porque os adolescentes são menos disciplinados que os adultos e porque os velhos tantas vezes se exprimem sem censura.
3 Aprendizado na infância. O autocontrole começa a ser construído já nas primeiras fases da vida. Walter Mischel, psicólogo da Columbia University (EUA), estudou a capacidade de autocontrole de 650 crianças de 4 anos. Ele pedia a elas que resistissem à tentação de comer um doce colocado bem à frente, enquanto ele se ausentava da sala durante alguns minutos, com a promessa de que, ao retornar, os que tivessem resistido receberiam em prêmio 2 doces. Com o passar dos anos verificou-se que as crianças que tinham conseguido esperar e recebido a recompensa (cerca de 65% do total) tinham alcançado notas mais altas no exame vestibular para a universidade, empregos mais bem pagos, casamentos exitosos e um melhor estado geral de saúde.
4 Força de vontade e coração forte. As pessoas que têm, por sua própria natureza, uma frequência cardíaca alta, em geral são mais habilidosas para resistir às tentações do que as demais. E não apenas: Suzanne Segerstrom, psicóloga e pesquisadora da Universidade do Kentucky (EUA( observou que as pessoas mais controladas manifestam um aumento provisório da frequência cardíaca nos momentos em que sua força de vontade é posta à prova. Essa modificação dos batimentos cardíacos reflete o esforço desenvolvido no sentido de ignorar aquilo que desejamos, concentrando-se, em vez disso, naquilo que acreditamos ser melhor para nós.
5 A inteligência ajuda a se distrair. As crianças com um quociente intelectivo mais alto, sobretudo quanto as habilidades verbais, são menos impulsivas do que a média; mas o contrário não é valido. A psicóloga Ozlem Ayduk da Universidade da Califórnia comprovou que as crianças com melhor autocontrole são mais eficientes também quando se trata de regular a própria atenção. Elas conseguem realizar truques intencionais para se distrair e não pensar no “prêmio” imediato. Afastando o objeto do prazer dos seus pensamentos, conseguem resistir às tentações.
Também os chimpanzés usam estratégias similares de autocontrole: eles renunciam à comida por até mais de vinte minutos, na esperança de receber uma outra que apreciam mais. Na espera, procuram se distrair e não pensar, mantendo-se ocupados em alguma brincadeira.
Também os chimpanzés usam estratégias similares de autocontrole: eles renunciam à comida por até mais de vinte minutos, na esperança de receber uma outra que apreciam mais. Na espera, procuram se distrair e não pensar, mantendo-se ocupados em alguma brincadeira.
6 Os homens são mais impulsivos. A capacidade de resistir às tentações apresenta diferenças notáveis entre homens e mulheres. Os homens parecem menos capazes de controlar seus impulsos do que as mulheres, e este é um fato que se torna evidente desde os 4 anos de idade. Isso é devido em boa parte às expectativas sociais: espera-se que as meninas sejam mais obedientes do que os meninos. É verdade também, que os homens têm uma probabilidade muito mais alta de não saber controlar a própria agressividade e de fazer uso de drogas. Culpa dos hormônios masculinos? Não exatamente: no período pré-menstrual as mulheres costumam diminuir suas capacidades de autocontrole.
7 Açúcar, energia para resistir. O autocontrole tende a se exaurir se for ativado durante um tempo excessivo. Isso foi descoberto pelo psicólogo Roy Baumeister: ele propôs a voluntários um teste que consistia em vários enigmas insolúveis, para verificar quanto tempo resistiam na tentativa de encontrar alguma solução. Pouco antes, porém, alguns tinham sido submetidos a um esforço de vontade. Foram eles os primeiros a renunciar a encontrar uma solução para os problemas. Significa que resistir a uma tentação pode esvaziar nossas energias, enfraquecendo a força de vontade. «Treinar a força de vontade é como treinar um músculo”, diz Baumeister «e é necessário esperar algum tempo antes de recuperar as energias gastas”. Os níveis de glicose no sangue parecem ser um indicador confiável da capacidade de autocontrole: se uma pessoa está empenhada em um esforço de vontade, o seu nível de glicose cai.
8 Escolha as suas batalhas. Os grande esforços de vontade podem exaurir todos os nossos potenciais. É sábio não pretender em excesso de si mesmo e estabelecer uma escala de prioridades.
9 Restringir o campo de interesses. É mais provável alcançar objetivos específicos (quero aprender a tocar o “Samba de uma nota só”) do que objetivos gerais (quero me tornar um grande violonista).
10 Comunicar suas intenções aos outros. Você se sentirá mais vinculado à manutenção do seu propósito para “não fazer feio” diante dos amigos e não desiludir as expectativas.
11 Elabore um programa detalhado. Decidir que irá à aula de ginástica toda quarta-feira é mais eficaz do que pensar fazê-lo uma vez por semana. Segundo Peter Gollwitzer, professor de psicologia na Universidade de Nova York, um programa concreto aumenta em 3 vezes as probabilidades de realizar os próprios propósitos porque utiliza melhor as energias mentais.
12 Potencializar as energias. O uso da força de vontade faz baixar o nível de glicose no sangue, exatamente como acontece quando fazemos algum exercício físico. Portanto, melhor reintegrar os açúcares se não quisermos perder os controles.
13 Pensar positivo sempre. É mais eficaz pensar em vencer do que se entregar ao temor de perder.
https://www.brasil247.com/pt/247/revista_oasis/304199/Errar-%C3%A9-humano-Perseverar-no-erro%E2%80%A6-tamb%C3%A9m.htm