RAMBO,
Ricardo Albino[1]
RESUMO
O presente trabalho, tem por objetivo
apresentar algumas ideias e conceitos, primeiramente sobre a Emancipação e, na
continuidade, relacionar com a proposta freireana da educação libertadora. O
texto trata de uma contextualização das ideias de Freire, sobre democracia,
educação e emancipação social como
prática política. Pois, tudo o
que trata de ação humana, não deixa de ser essencialmente ação política. Toda
ação humana marca uma posição no mundo frente às realidades sócio-históricas já
constituídas e, por isso, demanda novas ações, intervenção, rupturas que vão
demarcar e formar a transformação social. Falar de emancipação é falar das
condições de vida social, desejando dar saliência às práticas libertadoras, é
como escapar do universalismo neutro que esconde ou neutraliza muitas formas de
dominação. Liberdade aqui é no sentido de reinventar-se a partir da aposta da
conscientização crítica, ou na desconstrução discursiva dos sistemas diante das
condições de opressão,
PALAVRAS-CHAVE:
Educação, Emancipação,
liberdade, política e opressão
Proposta de Paulo Freire sobre emancipação dos
oprimidos
É sabido que emancipação, lendo Freire,
significa uma grande conquista política que só pode se manter na práxis humana
como luta continua em prol da libertação dos indivíduos. Além disso, também
deve ser ressaltada a questão, de que as pessoas despossuídas e com vidas
marcadas pela dor da desumanização, promovida pela opressão e pela dominação
social, são frutos negativos e deve-se olhar profundamente para se pensar na
superação das barreiras e portanto, no como emancipar. Além disso, é
fundamental compreender a aproximação dos conceitos de emancipação entre
Boaventura e Freire.
Falar em emancipação retomando Freire
(2000), é falar das diferentes formas de opressão e de dominação no mundo
neoliberal e de exclusão. É falar de pessoas que vivem de grandes necessidades
materiais, de subtração subjetiva e que acabam por ter ausência da alegria de
viver, da conscientização principal para conseguirem encontrar a liberdade, a
felicidade e a cidadania que desenha democracia.
Portanto, o processo emancipatório,
percorrendo essa visão, acontece de uma intencionalidade politica que assume um
futuro voltado para transformação social. Acontece por todos aqueles que são
comprometidos com a desopressão, como bem coloca Zitkoski (2006), ressaltando
que é, contrariamente ao pessimismo e ao fatalismo autoritário defendido pela
pós- modernidade, e ao mecanismo etapista do marxismo ortodoxo, que afirma o
processo de transformação social, como sendo “certo” e “inevitável”.
Na obra Pedagogia do Oprimido (2002),
Freire aponta e defende uma pedagogia para todos e que possam se emancipar,
mediante uma luta libertadora, que “só
faz sentido se os oprimidos buscarem a reconstrução de sua humanidade e
realizarem a grande tarefa humanística e histórica dos oprimidos – libertar-se
a si e os opressores” (FREIRE, 2002, p. 30).
Além disso, ou seja, continuar uma luta
pela transformação social, visando emancipação, o projeto emancipatório
defendido por Freire também chama atenção para o multiculturalismo, clareando
que o direito de ser diferente, significa sociedade democrática. Para
identificar mais claramente aquilo que Freire defende como projeto
emancipatório, é condição fundamental que se busque uma sociedade
socialista.
Não se pode falar de emancipação no
pensamento de Freire sem que se fale da relação entre política, educação e
emancipação. Segundo o autor, é uma relação necessária entre política e
educação, mas não necessariamente entre educação e emancipação. Ele coloca que
o potencial educativo, vem da articulação possível, sem deixar de esquecer que
é tensionado durante a prática através do engajamento do laço social. Por isso
é importante perceber que não significa que a prática educativa possa
transformar por si só a realidade porque compreende, que a transformação
qualitativa da sociedade acontece na alternativa das condições materiais
objetivas, pela práxis humana coletiva, nomeando com isso, a luta de classes.
“No atual contexto latino-americano
embate colocado para o campo da esquerda e, portanto, para as forças políticas
progressivas é a luta contra a hegemonia neoliberal e, igualmente, a construção
de alternativas a esse projeto que está levando à barbárie o mundo
todo”(Zitkoski, 2011, p. 12).
Quando Freire diz que há entre política
e educação uma relação intrínseca, se objetivo é esclarecer que a tensão entre
esses conceitos vai demonstrar que não há prática política esvaziada de
significado educativo, assim como também não há educação neutra.
Caminhando por essa via da relação entre
política e educação, encontra-se nas leituras de Freire uma constatação de que
pode ocorrer uma visão ingênua, querendo negar a natureza política do processo
educativo e, portanto, desfazendo a condição fundamental dos indivíduos como
sendo processos históricos. Explicando-se mais claramente, Freire vem dizer que
em formações sociais onde predomina o modo de produção capitalista, os homens
agem no interior da totalidade estruturada e que se determina pelas relações de
produção entre capital e trabalho. Nesse sentido, os homens são autores
representando os detentores de meio de produção e de acumuladores de capital:
os exploradores. Além disso, os homens em seus papéis de representantes
sociais, tornam-se despojados dos meios de produção e se acomodam como
vendedores de força de trabalho: a exploração. Portanto, eles, os homens,
sofrendo os efeitos do determinismo da fatalidade social, cabem as perguntas: A
atuação do educador será a favor dos que oprimem, ou daqueles que são
oprimidos? O educador lutará pela ordem dos que exploram ou pela libertação dos
explorados?
Uma das grandes tarefas para aqueles que
atuam na causa dos oprimidos está, justamente na desnaturalização da atual
forma social, as quais naturalizam as desigualdades. E, acompanhando o efeito
da ideologia dominante, esse discurso é interiorizado e propagado, inclusive,
por aqueles que sofrem a opressão e exclusão.
Imersos neste tipo e visão, separando
política de educação, esses indivíduos passam a viver radicalmente a educação
da neutralidade. Para Freire essa visão é funcional aos opressores com largo
interesse no ocultamento da realidade e na manutenção do sistema capitalista.
Tanto a neutralidade quanto a manutenção de uma sociedade perversa, os entraves
vão se criando colocando-se como obstáculos à emergência da consciência de
classe e à organização da luta pela emancipação.
Na obra Pedagogia do Oprimido, Freire, entre outras coisas
fundamentais, coloca: “Se os homens são produtores desta
realidade e se esta, na inversão de práxis, se volta sobre eles e os
condiciona, transformar a realidade opressora, é tarefa histórica, é tarefa dos
homens” (FREIRE, 2005, p. 16). Esse trecho faz relação com ação libertadora
quando analisado pela ação contrária daquilo que é dito acima, no sentido da
palavra condiciona, que dá significado à ação dominadora, visto pelo lado que é
dito.
Mas afinal, como se dá a relação entre
educação e emancipação? Do ponto de vista lógico, no pensamento freireano,
entre esses dois termos, é uma relação de possibilidades. Vale dizer que daí
constata-se que pode ou não ocorrer.
Segundo o raciocínio freireano,
explica-se a necessidade de tensão entre os termos mencionados, revelando
então, possibilidades e potencial libertador das práticas educativas, para
iniciar-se o caminho das experiências que responderão ao plano emancipatório
O tensionamento, aqui mencionado, trará
sua expressão praticamente, no laço social consciente dos atores no processo
educativo, que tem como objetivo primeiro, a libertação dos oprimidos.
Embora existam educadores voltados à
luta pela causa dos oprimidos, ainda há muitos deles contribuindo
involuntariamente à dominação, fazendo valer a concepção bancária de educação.
Ou seja, os educadores na posição de detentores do conhecimento, e aos
educandos, a posição de objetos, passivos, mantendo uma condição de depósitos
do valor. Contrariando a função do educador bancário, Freire defende que, para
se manter uma prática de educação libertadora, o educador
“[...]
precisa reconhecer, primeiro, nos educandos um processo de saber mais,
os sujeitos, com ele, deste processo e não pacientes acomodados; segundo,
reconhecer que o conhecimento não é dado aí, algo imobilizado, concluído,
terminado, a ser transferido por quem o adquiriu e quem não o adquiriu (FREIRE,
1997. P. 29).
Aquilo que é dito acima, refere-se que
uma das premissas da Pedagogia do Oprimido é o reconhecimento do educando como
também um sujeito, agente do processo educativo, que é movido por seus
interesses, que faz escolhas, que age com intencionalidade e da sentido humano
ao mundo. É o reconhecimento da inserção do educador e do educando na luta de
classes, no sentido de assumir posição na luta entre opressores e oprimidos.
Na condição de muitos casos o educando
sujeito-agente encontra-se em sua situação existencial, preponderantemente um
sujeito sujeitado, adaptado em sua situação de opressão, considerando o que diz
Freire, quando expressa:
“Os oprimidos, contudo, acomodados
e adaptados, imersos na própria engrenagem de estrutura dominadora, temem a
liberdade, enquanto não se sentem capazes de correr riscos de assumi-la. E
terem, também, na medida em que, lutar por ela, significa uma ameaça, não só
aos que a usam para oprimir, como seus proprietários, mas aos companheiros, que
se assustam com maiores repressões” (FREIRE, 1998, p. 19).
Portanto, para Freire, a importante
função do educador crítico, é um ensinamento e um desafiador, que reconhece
através dos efeitos contraditórios gestados na realidade opressora, o educador
crítico deve problematizar, com seu educando, o significado da sua situação
existencial concreta. Ou seja, para que ela serve? E, dessa forma,
apresentando-a como problema que, por sua vez, o desafia lhe exigindo
resposta.
É importante não confundir “exigir
resposta”, com “falar ao povo sobre a nova visão de mundo”, ou tentar impor
qual quer que seja determinada visão, e sim dialogar sobre a visão de mundo que
se manifesta nas mais variadas formas de uma ação. Colocando de outro modo, não
se trata de falar sobre a vida do povo, mas de ouvi-lo para falar com o povo.
Pretender a libertação, é transformá-lo novamente em objeto, é fazer cair no
engodo populista da massa de manobra.
Na visão freireana, o educador está
envolvido no processo de formação para a autonomia dos sujeitos. Quando o
educador está envolvido para a autonomia dos sujeitos, reconhece a ausência das
práticas educativas conservadoras, ou seja, voltadas exclusivamente para a
adaptação à produção e reprodução social. Aqui, mostra o papel da Pedagogia do
Oprimido, quando problematiza conservação e reprodução social.
Para compreender melhor o método de
Freire para alcançar experiências emancipatórias, trabalhando constantemente na
ação libertadora para autonomia e posição crítica da realidade, é importante
saber sobre educação sistemática e trabalhos educativos.
No processo da educação sistemática, as
práticas se voltam dominantemente à manutenção das estruturas sociais,
conformando-se enquanto processo de subjetivação/interiorização de valores
funcionais à ordem. Em outras palavras, significa: qualificando sujeitos para a
produção pura e para a reprodução da submissão à ideologia dominante.
Importante aqui é entender que possibilidade de melhora na condição de vida dos
oprimidos, há que se alterar a reprodução dos lugares ocupados na economia e na
divisão social do trabalho, para que, também possa se alterar a partir de
práticas libertadoras e emancipatórias, a condição de explorador/explorado das
sociedades capitalistas.
Outras políticas educativas, referentes
aos trabalhos educativos, referem-se às práticas libertadoras, comprometidas
com a emancipação dos oprimidos. As práticas libertadoras também se comprometem
com o ensino de conteúdos, mas estão prioritariamente, voltados à
conscientização de seus agentes, que implica:
“[...]que ultrapassaremos a esfera espontânea
de apreensão da realidade, para chegarmos a uma esfera crítica na qual a
realidade se dá como objeto cognoscível e no qual o homem assume uma posição
epistemológica. A conscientização é neste sentido, um teste de realidade.
Quanto mais conscientização, mais se desvela a realidade, mais se penetra na
essência fenomênica do objeto, frente ao qual nos encontramos para analisá-la.
Por esta mesma razão, a conscientização não consiste em estar frente à
realidade assumindo uma posição falsamente intelectual. A conscientização não
pode existir fora da práxis, ou melhor, sem o ato ação-reflexão. Esta unidade
dialética constitui, de maneira permanente, o modo de ser ou de transformar o
mundo que caracteriza os homens. Por isso mesmo, a conscientização é um compromisso
histórico. É também consciência histórica: é inserção crítica na história,
implica que os homens assumam o papel de sujeitos que fazem e refazem o mundo”
(FREIRE, 1989).
A consciência acima
mencionada se refere a consciência relacionada à análise rigorosa das condições
objetivas sociais e que tem um vínculo substantivo com a prática.
Sem o desvelamento das condições sociais
opressoras pela critica reflexiva, não é possível prática transformadora e
consequentemente, não é possível experiências emancipatórias. Mas não se deve
esquecer que para haver prática, há que se ter e saber a teoria. Em outras
palavras, dominação/subordinação tem conceito, teoria e fundamentação que
antecipam à prática. Além disso, nas observações e preocupações de Freire, há
relevância com a participação horizontal e que não significa igualar educador e
educando no processo educativo. O educador crítico contribui para que as
classes subalternas se apropriem do conhecimento produzido historicamente pelos
homens, conhecimento este que compreende a filosofia, a política, a economia, o
direito, entre outras áreas do saber. Mas tudo isso não é possível quando
desvinculado das condições objetivas materiais. A Pedagogia do Oprimido é luta
por direito, por reconhecimento aos estudos das classes subalternas. A
Pedagogia do Oprimido se revela como luta política e educacional no interior da
ordem, mas com vistas à derrubada dessa ordem. É ainda a Pedagogia do Oprimido
um estudo profundo e fundamental como mais uma importantíssima alternativa da
prática libertadora dos despossuídos e que, na sua narrativa encontra-se
conteúdos raros e fundamento para a existência da realidade da emancipação.
Para Freire, a superação autentica da
contradição opressores-oprimidos se situa para além da simples troca de lugar
entre agentes, pois pode demarcar uma situação, na qual se verificaria apenas a
passagem dos indivíduos de um pólo a outro, seja nas relações econômicas quanto
nas relações de submissãosubordinação política e ideológicas que implica que:
“Raros são os camponeses que, ao
serem promovidos a capatazes, não se tornaram mais duros opressores de seus
antigos companheiros do que o patrão mesmo. Poder-se-ia dizer – e com razão –
que isso se deve ao fato de que a situação concreta, vigente de opressão, não
foi transformada. E que, nesta hipótese, o capataz, para assegurar seu posto,
tem de encarar, com mais dureza ainda, a dureza do patrão” (FREIRE, 1987,p.
18).
Considerações Finais
Ao longo do texto
discutimos do significado de emancipação em
Freire. Nesse tema, abordamos a
discussão sobre a educação para a
liberdade e a
libertação das pessoas.. Porém, em se tratando de
liberdade, compreendo a partir de Freire, que é também uma dimensão utópica que depende de outros
projetos sociais dando continuamente na ação e na transformação da realidade. O processo pelo qual se faz
continuamente é a inserção do sujeito oprimido na luta pela libertação dessa
opressão.
A discussão é
importante na busca da superação do estado da heteronomia e da situação de
opressão, fazendo com que essa realidade torna-se possível
desde uma prática libertadora e
social com os oprimidos.
A
emancipação nada mais é do que o processo de libertação política,
cultural, humana
e social de
todos os oprimidos,
que se libertam a
si e aos
opressores desde a prática
de não mais
deixarem ser oprimidos
por ninguém.
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Licenciado em Filosofia com Habilitação em Filosofia, pela Faculdade de
Filosofia Nossa
Senhora da Conceição de Viamão,
Especializado em Gestão de Pessoas pelo IERGS. Técnico Administrativo na
UFRGS. Mestrando no
PPGEdu-UFRGS na Linha
de Pesquisa Universidade – Teoria e
Prática sob a
orientação do Prof.
Jaime José Zitkoski.
https://www2.faccat.br/portal/sites/default/files/rambo.pdf